Vindos Do Céu 5q6rl

Vindos do Céu

Irmãos Silva

CAPÍTULO UM

Em algum lugar na vastidão do espaço, entre um planeta e uma estrela jovem, duas espécies batalhavam pelo controle de uma arma com energia inimaginável: o Diorak.

Os Predadores, uma raça humanoide com garras, olhos felinos, presas e orelhas pontudas, parecia ter nascido para guerra, e por isso havia prevalecido com o controle do Diorak por gerações. Já os Gordonianos não tinham tanta sorte, eram pequenos, esverdeados, com grandes olhos negros e um cérebro gigantesco; mas o que lhes faltava em tamanho sobrava em ambição. Não havia uma única história em que fosse esquecidos os esforços dos Gordonianos de retomar o Diorak das mãos malignas de seus inimigos. E naquele momento era exatamente o que estavam fazendo; aquela era a primeira vez em centenas de anos que os Gordonianos tinham a arma de volta em sua posse.

Havia usado de sua inteligência para invadir de forma sorrateira o planeta dos Predadores e desaparecer com a arma em menos de um único dia. Mas o plano não foi 100% bem sucedido; durante a fuga os Gordonianos foram identificados acima da atmosfera do planeta, e logo a perseguição dos Predadores começou.

Agora, vários anos de distância do planeta dos Predadores, a nave mãe Gordoniana estava cercada por centenas de pequenas naves Predadoras, naves pontiagudas que agiam como vespas furiosas, todas lutando contra as naves enlanguescidas como tigelas da tropa dos gordonianos. De longe, afastada da batalha real, estava a nave mãe Predadora.

Na ponte de comando gordoniana estava Artoryus, o Comandante Gordoniano

que havia conquistado aquela vitória, e agora lutava para mantê-la custe o que custar. Lá também estavam uma dezena de soldados, navegadores e engenheiros, todos trabalhando para o funcionamento perfeito da nave. Artoryus, sentado em sua poltrona no meio da ponte de comando, encarava a batalha pelo enorme de controle a sua frente.

— Potência do escudo em 30%, senhor – gritou um soldado gordoniano do para o comandante.

— Como estão nossas naves? – questionou o comandante.

— Menos de 15 ainda estão em batalha – respondeu outro soldado.

— Maldição! – Artoryus socou o apoio da poltrona – Não podemos deixá-los pôr as mãos no Diorak. Mal posso imaginar o que fariam conosco se conseguissem. Qual sua situação?

— Não há nenhum sinal de dano ou penetração no compartimento do Diorak, senhor.

— Excelente. Vamos continuar nossa luta. Daremos tudo que temos para proteger o objeto, e caso os Predadores avancem mais, daremos até nossas vidas para protegê-lo.

Todos da ponte de comando respiração fundo e suspiraram com aquela ideia, mas não foram contra as ordens. A batalha prosseguia, e os Gordonianos fariam

de tudo para proteger o Diorak.

Do outro extremo da batalha, na nave mãe Predadora, Ingr, o comandante predador, contemplava a vitória que estava por vir – era como se pudesse sentir o Diorak em suas mãos desde já. Um soldado Predador se aproximou enquanto analisava o comm-link preso em seu pulso.

— Atualizações da batalha – disse Ingr sem tirar os olhos do grande de vidro que lhe dava a visão perfeita da batalha.

— Nossas naves prevalecem em número e em capacidade de ataque, senhor – respondeu o soldado Predador – Nossos inimigos não têm a menor chance. A vantagem é toda sua.

— Errado! – gritou o comandante – Enquanto estiverem em posse do Diorak a vantagem é toda deles. Ordene a invasão. Tragam o Diorak pra mim!

— Sim senhor – o Predador se afastou do comandante e começou a caminhar pelos corredores da nave, ando as ordens para os soldados em campo através do comm-link – O Comandante ordenou a invasão! Se parecerem, que seu fim seja indolor, e que suas imagens durem para sempre em nossas memórias.

As naves Predadores que cercam a nave mãe Gordoniana começaram a se afastar assim que a ordem foi dada, fazendo uma volta no espaço, se afastando da nave por um segundo; juntas, como vespas que defendem o vespeiro, ou que atacam o predador, as naves voaram contra a nave inimiga novamente. Muitas delas explodiram de imediato contra o impacto do escudo da nave mãe, mas por fim, quando o escudo abaixou, algumas começaram a perfurar a lataria.

— Escudo em 10%, senhor! – falou um dos gordonianos no de controle.

— Ordenem a evacuação! – disse o comandante Artoryus enquanto se levantava da cadeira e seguia pela nave – E alguém pegue o Diorak!

Quando o escudo enfim se desfez, as naves Predadores penetraram a nave inimiga – elas serviram como uma rolha pro vácuo do espaço. A parte dianteira das naves se abriu e dezenas de Predadores começaram a invadir da nave gordoniana.

— Senhor, estamos dentro – disse um Predador pelo comm-link – Achem o Diorak! Eles não podem escapar com ele.

Os soldados Predadores se espalharam pela nave exterminando todo Gordoniano no caminho enquanto Artoryus, do outro lado da nave, chegava em segurança a uma sala repleta de monitores e Gordonianos que supervisionavam o estado do Diorak, contido em um cilindro de vidro no centro do lugar. O Diorak parecia uma bolha viva, dourada e brilhante, pulsando como um batimento.

— Precisamos tira-lo daqui! – ordenou Artoryus assim que entrou no cômodo – Se o Diorak cair nas mãos dos nossos inimigos... não haverá segundas chances.

Um soldado foi imediatamente até o Diorak e retirou o cilindro da base tão maior quanto um gordoniano. Um segundo soldado se aproximou com uma cápsula oval nas mãos. O cilindro foi aberto e o Diorak deslizou até a cápsula oval onde; quando ele se prendeu, a luz e o som estático do Diorak foram sufocadas. Por fim, o soldado com a cápsula se aproximou do Comandante Artoryus.

— Leve isso com você, soldado – falou o comandante, apoiando suas mãos no ombro do gordoniano – Precisa pegar um casulo e escapar; ir para o mais distante possível daqui! Está nas suas mãos agora, filho.

O soldado assentiu, e de imediato começou a correr pelos corredores da nave. Vez ou outra, num corredor, ele esbarrava com grupos de Predadores lutando contra Gordonianos – ou melhor, massacrando-os sem dó. Depois de algum tempo de correria e escape de balas, o soldado enfim entrou no compartimento onde as cápsulas de fuga ficavam. Com o Diorak em um dos braços, o soldado Gordoniano iniciou a cápsula de fuga com alguns cliques nos botões na parede. A cápsula se iniciou, sacudiu e tomou energia para escapar. Voando por entre as naves Predadoras e Gordonianas pela batalha, a cápsula parecia um projétil.

— Cápsula lançada, senhor – disse um gordoniano no de controle na ponte de comando.

— Sucesso em sua missão, pequeno soldado – murmurou o comandante de sua cadeira.

Da ponte de comando, o Comandante Predador se ergueu ao ver a cápsula gordoniana se afastando a cada segundo.

— Senhor, identificamos uma cápsula de fuga, e sua energia é muito maior que a média – disse um Predador na ponte de comando.

— O Diorak – Ingr murmurou.

— Podemos interceptar?

— Negativo! Se aquela nave for abatida o Diorak poderá expandir e liberar energia o suficiente para dizimar meia dúzia de sistemas a nossa volta, se perdendo para sempre. Mas também não podemos deixa-lo escapar... – ele pensou por um segundo e suspirou – Ative o Protocolo 18.1.

— Mas... senhor...

— Faça, agora! – o comandante gritou sua ordem outra vez.

Os soldados Predadores se olharam e, juntos, viraram cada um uma chave no de controle. Um botão vermelho surgiu na cadeira do Comandante, e ele o apertou sem pensar ou hesitar. De imediato um buraco negro explodiu no meio da nave mãe Predadora. A nave foi sugada num segundo e, ao redor, todas as naves em batalha, além da nave mãe Gordoniana, começaram a ser sugados pelo buraco negro.

Da nave mãe Gordoniana, Artoryus contemplava a cena hipnotizante a sua frente; quando sua mente enfim entendeu a situação, Artoryus, o comandante gordoniano, com um toque no no braço da poltrona, sua voz começou a ecoar por toda nave.

— Senhores, aqui é seu Comandante. Chegamos ao fim de nossa batalha, de nossa jornada. Foi uma honra servir com todos.

Por um segundo o comandante apenas comtemplou seu fim, um fim que viria por algo tão incrível e grandiosos. Ele fechou os grandes olhos e esperou – não demoraria muito mais. Foi quando uma mensagem tocou no de controle da nave.

— Quais são minhas ordens, senhor? – Artoryus ouviu a voz do soldado em sua cápsula de fuga.

Ao ouvir a voz do soldado na cápsula, os olhos do comandante dobram de tamanho.

— Soldado, atualize seu status – comandante saltou de sua cadeira e se aproximou do , batendo no ombro de um dos soldados ali – Encontre a nave.

A cápsula apareceu na grande tela, tomando quase toda a janela dianteira. Ela estava distante da batalha, bem mais que qualquer outra nave, e apesar de parecer fazer todo esforço possível não conseguia sair do lugar.

— Fui pego pelo Horizonte de Eventos, senhor – o soldado respirava ofegante, talvez olhando para trás vendo a infinidade do buraco negro – Sinto muito.

— Vejo sua localização, você está quase livre, soldado. Você sabe o que fazer: salve o Diorak! Esconda-o no buraco mais distante da galáxia.

— Sim, senhor – a voz do soldado veio num murmúrio; não queria se entregar, mas entendia a importância da missão.

O Gordoniano na cápsula remexeu o casulo oval do Diorak e o coloca na câmara de disparo. Com a rota calculada e travada no , ele atirou. O Diorak, dentro de seu casulo, foi ejetado como um torpedo cortando o espaço, saindo das mediações do buraco negro num segundo. Artoryus via tudo em seu , percebendo um novo ponto – o Diorak escapando do fim inevitável para os outros.

— Objeto a salvo, senhor.

— Bom trabalho, soldado – respondeu o comandante antes de seguir de volta para a cadeira de comando – Agora vamos torcer para que não caia nas mãos erradas.

O buraco negro apenas terminou seu trabalho, sugando qualquer sinal de vida ao seu redor, até sobrar apenas ele no espaço vazio. O Diorak continuou seu caminho sozinho pelo espaço, indo até seu novo alvo.

CAPÍTULO DOIS

Na Terra, em geral, as coisas ainda eram comuns. Principalmente na Cidade Velha.

Em uma sala de aula, no laboratório de biologia, escondido entre as cadeiras mais ao fundo, estava Andrew, babando sobre o caderno de anotações enquanto o professor continuava sua palestra sobre organismos e suas relações. Atrás de Andrew, que vez ou outra soltava um ronco chamativo, estava Natália, a melhor – e talvez umas das únicas – amiga do rapaz.

— A simbiose, ou mutualismo obrigatório, é uma relação ecológica que ocorre entre indivíduos de espécies diferentes – dizia o professor enquanto caminhava de um lado para o outro, apontando para suas anotações no quadro branco com uma régua na mão – No relacionamento simbiótico ambas as espécies dependem da presença do parceiro.

Apenas metade da turma prestava realmente atenção na aula, a outra metade desviava atenção para os celulares, a janela, uma página aleatória do livro... mas apenas Andrew dormia desta vez.

— Os resultados desta associação devem ser benéficos para ambas as espécies...

Um grande ronco ecoou por toda sala, chamando a atenção de todos de repente. O professor se virou direto para Andrew e Natália; a menina sorriu sem graça.

— Desculpe – ela respondeu.

— Continuando... – o professor se virou para o quadro outra vez.

Natália se esticou e cutucou o amigo a sua frente com a caneta.

— Andrew... acorda logo – ela murmurava.

— Há também o parasitismo. Esse tipo de relacionamento pode ser prejudicial, já que esses indivíduos podem viver no corpo de outra espécie, sem haver mutualismo...

Mais um ronco ecoante, desta vez arrancando risadas de toda classe.

— Alguém use de métodos mais eficazes para acordá-lo, por favor – o professor parecia cada vez mais impaciente.

Um rapaz se levantou num salto com a ordem do professor. Ele tinha um sorriso no rosto e um caderno enorme em mãos. Com uma batida na mesa com toda força que o garoto tinha. Andrew despertou num pulo, com os olhos arregalados.

— O quadrado dos catetos é igual a hipotenusa – ele respondeu de imediato.

— Seu conhecimento sobre matemática é tão abundante quanto por biologia, Andrew – respondeu o professor.

— Era o quadrado da hipotenusa – sussurrou Natália enquanto escondia o rosto com as mãos.

— Talvez possa demonstrá-lo ao diretor na sala dele, o que acha?

— Acho que consigo ouvi-lo melhor daqui, professor – respondeu Andrew com um sorriso amarelo.

Andrew continuou sorrindo pro professor, e uns três minutos depois já estava fora da sala, sentado irritado num banco do lado de fora no corredor ao lado da sala do diretor. Em suas mãos havia um pedaço de papel com a palavra Advertência em vermelho.

O sinal tocou e as turmas começaram a sair. Natália seguiu direto até Andrew, com um sorriso sarcástico no rosto. O rapaz se levantou antes dela o alcançar, e eles caminharam juntos pelo corredor.

— Não fala nada – disse Andrew.

— Por que falaria? – disse Natália – Só por que você não me escuta nunca?

— Sempre diz isso.

— Por que é sempre verdade. Você nem se esforça pra ficar acordado mais.

— O que eu posso fazer? Meu cérebro simplesmente desliga quando se depara com algo... chato.

— Você tem que se esforçar mais, levar as coisas mais a sério. Aposto que se ganhasse uma responsabilidade se tornaria mais maduro.

— Tô vendo que você espera demais de mim.

O rapaz esticou o braço assim que alcançaram as portas no fim do corredor, saindo da escola quase em sincronia.

Havia uma praça logo ao lado da escola; ela dividia bem o espaço onde as crianças brincavam, onde os idosos se exercitavam e os jovens namoravam. Andrew e Natália, no entanto, apenas avam por ali, caminhando lado a lado pela calçada.

— Vai ter uma maratona de Planeta dos Macacos lá no Antônio – disse Andrew, chutando algumas pedras no chão.

— Do antigo ou do novo? – perguntou Natália.

— Do clássico – Andrew deu ênfase na palavra – Acho que vão ar os três primeiros hoje.

— Esses são horríveis, e o cinema não é dos melhores também.

— Bem, o Antônio faz o melhor pra manter o cinema funcionando. E é super barato... e os filmes até que são divertidos... – Andrew parou de repente e segurou a amiga pelo pulso; ela de virou para olha-lo nos olhos – O que eu tô tentando dizer é: quer ir no cinema comigo?

— Tá me chamando pra sair? – o sorriso desta vez foi envergonhado – Tipo aqueles encontros dos filmes?

— É... eu acho que sim. É exatamente isso.

O sorriso de Natália aumentou por um segundo, e ela precisou desviar os olhos de Andrew. Aos poucos o semblante da menina foi mudando para algo mais sério, tenso, preocupado, e seus olhos ficaram fixos no céu.

— Ou então não – continuou Andrew, soltando a mão da menina enfim – Se quiser pode ser só...

Foi quando se deu conta que Natália estava estática, assim como as pessoas a sua volta. Andrew então se virou e viu o que apavorava a todos: um ponto de luz enorme do céu – um meteoro caindo a todo vapor. Ele vinha reto, cortando o ar como se tivesse sido disparado, como uma bala. Mas de repente, como a coisa mais sobrenatural no universo, ele fez uma grande curva, vindo direto pra cima da praça.

As pessoas pareceram ligar naquele momento, correndo e gritando em desespero por todos os lados. Andrew agiu; segurou Natália pelo pulso outra vez e ambos começaram a correr. Quando o meteoro atingiu a praça, uma explosão enorme jogou Andrew e Natália para longe.

Antes de apagar completamente o rapaz, caído no chão, conseguiu ver o estrago da explosão: as chamas, carros virados, o próprio asfalto solto sobre o meio fio; algumas pessoas corriam para longe, enquanto outras corriam ao socorro dos feridos ao redor. Antes de poder ver mais ou tentar se levantar, antes de conseguir encontrar Natália em meio aquela loucura, o rapaz enfim apagou.

CAPÍTULO TRÊS

Os helicópteros de uma rede de TV da Cidade Velha já faziam a cobertura da confusão na praça, que havia sido praticamente destruída após a queda.

— E podemos ver daqui os esforços dos agentes públicos da Cidade Velha em socorrer os feridos – dizia uma das repórteres enquanto o helicóptero gravava toda cena abaixo de si.

Em volta da cratera várias tendas foram feitas para atender os feridos. No centro da cratera havia uma grande tenda, cercando o objeto desconhecido caído do céu. Espalhados pelo lugar haviam carros de polícia, bombeiros e ambulâncias; além disso, toda a área estava cercada por uma faixa da polícia – atrás dela uma multidão de curiosos fazia o máximo para filmar, tirar fotos e conferir o que acontecia lá dentro.

— Ainda não há nenhum número confirmado de mortes – continuou a repórter – Mas podemos imaginar quantos não saíram feridos desse terrível desastre. É com você Marcel.

— Obrigado, Jennifer. Vamos agora para nossa representante no chão, Amanda Mendes.

— A situação aqui de baixo parece um pouco mais alarmante, Marcel – respondeu a segunda repórter ao vivo no local – Temos familiares apavorados por não poderem chegar até seus parentes na área afetada. Já faz três horas que

“Tendas de Contenção e Tratamento”, como estão chamando, foram colocadas em volta da área atingida. Todos que entram nessas tendas tem equipamentos de proteção contra radiação, o que torna a situação mais alarmante para os expectadores. Ainda não temos informações sobre o objeto que causou todo esse estrago, mas imagens tiradas de celulares dos moradores da localidade nos dão uma ideia de que, seja lá o que for, não é um meteoro comum.

Uma foto de baixa qualidade surgiu ao lado da repórter enquanto ela terminava de falar. Apesar da simplicidade da resolução, o formato oval e cinza do casulo em meio a fumaça havia ficado claro, além da luz dourada que saía por entre suas rachaduras.

Andrew estava em uma das tendas médicas ao redor da grande cratera, sentado em um tipo de maca simples. Sua cabeça estava enfaixada, assim como seus braços – um enfermeiro ainda enfaixava seu braço esquerdo.

— Você teve muita sorte – disse o enfermeiro; aquela era a frase que o garoto mais havia ouvido a manhã inteira – Já que não teve nenhum ferimento grave não vai precisar ir pro hospital.

— Eu não me lembro de quase nada – Andrew murmurou, falar ainda trazia dor.

— É provável que, devido ao impacto, tenha perdido a consciência durante algum tempo. Mas você não mostra sinais de ferimentos internos, concussão ou radiação.

O enfermeiro terminou seu trabalho e se afastou enquanto Andrew se ajeitava sobre a maca, usando com calma os braços para se apoiar.

— Obrigado doutor. Eu já posso ir?

— Infelizmente não – o enfermeiro remexia em uma mesinha mais perto da entrada da tenda; ela estava cheia de materiais e medicamentos – Ainda não sabem o que é essa coisa e nem o que ela pode causar às pessoas então... bem, até uma equipe especializada chegar, não podemos liberar ninguém que estava na hora do incidente.

— Quer dizer que eu estou preso?

— Não, claro que não. Só não posso deixá-lo ir agora. Pense nisso como... uma noite no hospital, mas fora do hospital.

— Parece uma contradição – o garoto sentiu a cabeça latejar, então a massageou com calma – Mas... tudo bem então. Tinha uma garota comigo. Natália. Sabe onde ela está? Ela está bem?

— Sim, eu sei sim – o enfermeiro já estava sem suas luvas; terminou de limpar as mãos com álcool e se aproximou do rapaz – Sua amiga sofreu sérios ferimentos, mas está recebendo o melhor tratamento da região.

— Preciso vê-la – disse Andrew já se levantando com uma careta de dor.

— Você não pode sair ainda, lembra? – o enfermeiro entrou no caminho.

— Disse que eu não tive ferimentos graves.

— Mas também disse que precisa ficar em observação por algumas horas para termos certeza de que não terá efeitos colaterais tardios.

— Eu o aviso se sentir alguma coisa doutor, mas agora vou achar minha amiga – Andrew sorriu e deu um o para o lado.

A imagem da policial mal encarada entrando na tenda, repentinamente, fez o garoto paralisar novamente.

— O que está acontecendo aqui? – a policial parecia gritar, mesmo falando num tom comum; talvez fosse sua farda ou sua postura, ou os dois.

— Eu... – Andrew pigarreou, mas forçou a se manter firme – Eu preciso sair pra encontrar minha amiga, então... saiam da minha frente!

— Opa, opa, opa, como é? – a expressão da mulher fez Andrew engolir em seco – É melhor você pegar mais leve e se acalmar, garoto! Ou prefere que eu acalme você? – o rapaz nada respondeu, apenas negou com a cabeça – Ótimo. Agora volte pra sua maca e siga as orientações do enfermeiro. Todos os feridos estão sendo tão bem tratados quanto você.

— Então eu estou mesmo preso aqui – perguntou o rapaz enquanto dava meia volta e sentava na maca outra vez.

— É como se fosse – respondeu a policial com certo sarcasmo.

— Isso é abuso de poder, sabia policial?

— Sabia sim, mas é pro seu bem, garoto.

A policial acenou pro enfermeiro e então saiu da tenda. O enfermeiro, meio sem jeito, voltou para seus instrumentos médicos sobre a mesa, ficando de lado para Andrew sobre a maca.

— Bem, acho melhor te dar um sedativo leve. Ele não vai te apagar, só vai te acalmar um pou... – ao se virar o enfermeiro não viu o rapaz, e a parte traseira da tenda estava levemente levantada.

Andrew caminhava de tenda em tenda, procurando por Natália; as tendas tinham um plástico na lateral, como uma janela embasada. Depois de conferir umas três tendas, ele por fim a encontrou. O rapaz levantou o canto da tenda e entrou sem pensar duas vezes. A menina estava deitada inconsciente na maca, com uma bolsa de soro presa ao braço; uma enfermeira tomava conta dela, conferindo a bolsa de soro, de costas para Andrew no momento.

— AI MEU DEUS, GAROTO – gritou a enfermeira ao ver o rapaz surgido do nada – Você não deveria estar aqui!

— Eu sinto muito, senhora, mas eu... – o rapaz gaguejou – Eu precisava vê-la.

— Ela está bem; só um pouco fraca devido os ferimentos, mas bem. Mas não conseguimos acordá-la ainda.

— Eu posso falar com ela?

A enfermeira assentiu enquanto abria agem, e Andrew se aproximou de

Natália. Ele se abaixou ao lado dela, apoiando a mão em seu ombro, sem saber o que dizer. A única resposta ou consolo que seu corpo o permitiu fazer foi chorar.

Cinco vans negras pararam atrás da multidão. Vinte homens saíram delas – todos de ternos e óculos escuros –, atravessando a multidão quase como que a cavando, parando apenas ao chegar à faixa da polícia.

— Desculpe amigo, ninguém pode ar – falou um policial, já estendendo a mão – Essa é uma área em quarentena.

Um dos homens engravatados se aproximou do policial, tirou seus óculos e sorriu. Ele levou a mão ao bolso e sacou um distintivo octogonal dourado, com o nome “Agente Especial Miller” no centro e a sigla C.O.A.R. na parte superior.

— Meu nome é Agente Ezra Miller, policial. Eu e meu pessoal fomos enviados pela agência COAR para lidar com a situação.

O policial arregalou os olhos ao ver o dourado do distintivo brilhar com a luz do sol. Ele logo abriu caminho e os agentes seguiram pelas tendas, guiados pelo Agente Miller, já vestindo os óculos novamente. No centro da cratera o Diorak pareceu ouvir a voz dos agentes.

Dentro da maior tenda no lugar, a criatura dourada saiu de seu casulo, se agarrando pela cratera com formato de uma pequenina aranha. Ele saiu da tenda num segundo sem ser percebido pelos policiais que a vigiavam. A pequena aranha dourada correu por todas as tendas, vendo os agentes se aproximando ainda mais. A criaturinha se virou para o lado e entrou numa tenda amarela, praticamente vazia, apenas com um policial na porta e algumas mesas cheias de objetos dos feridos pela explosão. Com suas patinhas pontiagudas o Diorak subiu em uma das mesas, deslizou por entre os objetos até encontrar uma mochila desgrenhada, com um verde desbotado. A criaturinha abriu a mochila,

remexeu os objetos lá dentro – um caderno, canetas, uma carteira –, até por fim encontrar um celular; num tipo de abraço a Aranha-Diorak se desfez e desapareceu dentro do aparelho.

O Agente Miller parou quase no centro do local, apontando para que seus agentes seguissem por as tendas ao redor. Depois de pigarrear, o agente gritou.

— QUEM ESTÁ NO COMANDO AQUI?

— Sou eu mesma – respondeu a capitã Diaz, uma mulher de cabelos castanhos longos e mão na coronha – O que vocês, engravatados, querem aqui?

— Meu nome é Agente Ezra Miller. Eu e meu pessoal fomos enviados pela agência C.O.A.R. para lidar com o incidente.

— Sou a Capitã Diaz, a responsável por essa operação, e a situação já está sobre controle. Isolamos objetos, tratamos os feridos e, já que vocês demoraram tanto pra chegar, demos um jeito de descobrir se o lugar era radioativo ou contagioso. Quer saber o que eu descobri, Agente Miller?

— Descobriu o que nós também já sabemos, capitã Diaz – o homem ajeitou os óculos e levantou os olhos para ver a tenda central a alguns metros – Nossa análise do objeto no momento da queda constatou que não havia perigos de infecção. Para que não houvesse interrupções no trabalho de salvamento que vocês fizeram belamente, nos ausentamos até que a situação estivesse apaziguada. Mas, agora que estamos aqui, vamos resolver o que realmente importa.

— Que seria? – a capitã cruzou os braços em ironia.

— Descobrir o que se esconde abaixo daquela tenda, capitã Diaz. E eu aposto minha calça que, o que quer que tenha caído do céu, nem está mais lá.

— Está dizendo, Agente Miller, que há algo vivo lá dentro?

— Estou dizendo, capitã Diaz, que meteoros não fazem curva – Miller tirou os óculos para sorrir com os lábios e os olhos – E aquela coisa, seja lá o que for, não está mais na sua tenda, mas sim a solta por aí. Então saia da minha frente, por favor, e me deixe trabalhar.

A capitã fez uma careta e, apenas por burocracia e hierarquia, a mulher abriu caminho para o agente. Miller revestiu os óculos e seguiu caminho até a tenda central. Ele sacou um tipo de aparelho celular, colocou uma senha e abriu uma aplicação, analisando o ambiente a sua volta – a quantidade de energia, o calor, o nível de radiação – enquanto seguia para o objeto oval no centro da cratera. O Agente Miller abriu a tenda e entrou, sentindo o calor do objeto; o agente se abaixou ao lado do objeto aberto no chão.

— Peguei você – ele murmurou.

Andrew agora estava sentado num banquinho ao lado da menina inconsciente – banquinho esse que a enfermeira havia conseguido. O rapaz segurava a mão de Natália, com o rosto molhado de lágrimas e os olhos vermelhos. A enfermeira também estava na tenda, o mais afastado possível, junto dos equipamentos médicos.

— Sinto muito, Natália – Andrew sussurrou – Eu queria poder... tirar isso de novo. Trocaria de lugar contigo sem pensar.

— Tenho certeza que ela sabe disso – Andrew se virou para ver a capitã Diaz atrás dele, na entrada da tenda – Desculpe garoto, não queria te assustar. Sou a capitã Diaz, chefe dessa... loucura toda.

— Descobriram alguma coisa? Algo que possa nos ajudar?

— Infelizmente eu não sou médica, nem cientista. Eu vim até aqui saber se você é o Andrew Galadaz.

— Por que não revirou minha mochila e olhou minha identidade? – o rapaz voltou sua atenção pra amiga, desviando o olhar da capitã – Não é isso que os policiais fazem?

— Relaxa garoto. Não é isso que policiais fazem, nós cuidamos da população. E isso inclui as vezes ir atrás de um garoto cujo pai está procurando enlouquecidamente.

— É melhor darem um choque nele, por que eu não vou sair daqui. Não vou deixar minha amiga sozinha.

— É, e o que vai fazer? – a capitã levou a mão à cintura – Vai chorar na mão dela até ela acordar?

— Desnecessário – Andrew murmurou.

— Me desculpe, mas que tal isso... – ela se aproximou a apoiou a mão no ombro de Andrew – Eu mesma ficarei incumbida de enviá-la para o melhor hospital da cidade e darei um jeito de te avisar caso tenha qualquer mudança no estado dela. Temos um acordo?

Andrew encarou a amiga mais uma vez e apoiou a mão de Natália em sua barriga. Ele secou o rosto molhado, suspirou e se levantou diante da capitã.

— Por favor, cumpra sua palavra, capitã.

— Eu sempre cumpro, garoto – a mulher deu um tapinha no braço do rapaz – Suas coisas estão na tenda amarela a esquerda. Pegue-as e saia daqui.

Andrew assentiu, olhou para trás uma última vez antes de sair da tenda dela. Na tenda de Natália a Capitã Diaz permaneceu. Ela se virou para enfermeira e falou depois de suspirar.

— Pode me dizer alguma coisa sobre a situação dessa menina? – perguntou a capitã.

— A verdade, capitã, é que ela é uma das pessoas que mais sofreu com a explosão, e não mostra sinais de melhora – respondeu a enfermeira.

A capitã assentiu e se virou para olhar Natália sobre a maca, se perguntando como poderia cumprir sua promessa.

Havia uma dúzia de mesas dispostas dentro da tal tenda amarela, todas cheias de bolsas, pastas, mochilas e coisas guardadas em plásticos. Na porta um policial guardava os pertences. Andrew seguiu direto para sua mochila verde desbotada e desgrenhada no fundo da tenda. Ele a conferiu rápido, como orientação do policial, para ter certeza de que suas coisas estavam lá – seu caderno, canetas, sua carteira e celular. Ele a vestiu e saiu do lugar, dando um aceno simples do policial.

Enquanto andava por entre as tendas, Andrew viu o pai meio perdido pelo lugar, caminhando junto dum policial. O senhor Galadaz caminhou rápido até o filho, o segurou e abraçou com toda força que tinha, fazendo Andrew gemer de dor.

— Tá tudo bem, pai, eu juro – disse Andrew quando o pai o soltou.

— Você me assustou, filho! – o homem sorria enquanto as lágrimas escorriam – Tem certeza que não está ferido? Pode não estar sentindo ou vendo...

— Eu tenho certeza. Os médicos fizeram exames e... coisas de médico. Acho que eu só... quero ir pra casa agora.

O Sr. Galadaz assentiu, ou o braço por trás do pescoço do filho e ambos seguiram até o carro a alguns metros após a multidão. Os policiais abriram caminho para os dois entrarem na caminhonete.

— Pai, a Natália...

— É, eu encontrei com os pais dela – respondeu o Sr. Galadaz enquanto ligava o carro – Eu sinto muito, filho. Eles disseram que vão manter contato, vão falar assim que ela melhorar.

— É... uma policial me disse a mesma coisa. Acho que isso é um código pra quando alguém não sabe mais o que dizer.

Eles ficaram em silêncio a partir de então. Andrew jogou sua mochila na parte traseira e se ajeitou no banco do ageiro. Ele apoiou a cabeça na janela enquanto o carro ligava e partia.

CAPÍTULO QUATRO

Sentado em sua cadeira na ponte de comando, Plediax, o Comandante Predador encarregado de encontrar o Diorak, esperava impaciente por atualizações da missão. A tripulação seguia migalhas que o sinal do Diorak havia deixado para trás atrás do espaço. Algo enfim se acendeu no da ponte de comando, chamando a atenção de Plediax.

— Senhor, acho que o encontramos – disse um dos soldados sobre o de controle.

— Suposições não são o suficiente – respondeu Plediax.

— Ele está certo, senhor – respondeu um segundo Predador, digitando algum comando sobre o , revelando distância e localização do sinal com mais clareza – Esse sinal é maior que os outros, além de ser semelhante ao sinal que interceptamos na nave Gordoniana.

— E onde está?

— Sistema Solar, planeta Terra.

— Então, já sabemos nosso próximo alvo – o Comandante Predador se levantou e encarou o grande a sua frente, com a imagem do planeta azul centralizado – Preparem as tropas para interceptação.

Após jantar e dar um desanimado “boa noite” para o pai, Andrew subiu até seu quarto e se trancou lá. Sua mochila estava jogada no chão perto da cama; com o celular já em mãos, Andrew se jogou sobre o colchão.

Não demorou um minuto para ver várias reportagens do incidente na praça – ele não as lia, só ava por elas. Decidiu desviar atenção daquelas coisas, então abriu uma rede social; não houve muita diferença. O rapaz tinha umas poucas dezenas de mensagens de amigos perguntando como estava ou apenas desejando melhoras. Ele também viu postagens sobre Natália, com frases “estamos pensando em você”, “melhore logo” e “#saudades”, com fotos das pessoas expressando sua tristeza.

— Falsos – o garoto bufou.

Enquanto olhava mais e mais as publicações, mais e mais a raiva dentro dele aumentava. Seus olhos se apertavam, suas sobrancelhas arqueavam, ele apertava o celular, até o aparelho começar a derreter por entre seus dedos.

— Mas que... – Andrew se espantou ao sentir a aparente fofura do celular.

Enquanto ainda tentava entender a situação, fiapos dourados se projetaram do aparelho e pularam nas mãos do rapaz, começando a se espalhar por seu pulso e braços. Andrew se sentou na cama e sacodiu os braços em desespero, mas os fios não paravam de se espalhar, tomando mais e mais os membros do garoto. Andrew tentou gritar, mas num segundo os fios se tornaram placas, e as placas tomaram seu corpo, sufocando o grito.

O que alguns minutos havia sido seu celular agora era um tipo de casulo octogonal parado sobre a cama. Aos poucos ele tomou a forma perfeita do corpo de Andrew, agora agindo muito mais como algo plasmático. O garoto ficou de pé num salto.

— Que droga é essa? Tá fazendo o que? Me deixa sair! – ele falava enquanto tateava o corpo tomado pelo formato dourado e metálico.

Ele se virou involuntariamente para a janela aberta do quarto, e, de um segundo para o outro, alçou voo, subindo em direção as nuvens.

— ME DEIXA SAIR! – Andrew gritava a todo momento.

O Diorak não parecia o ouvir, e parava de subir, como que escapando daquele planeta. Andrew fechou os olhos dentro do capacete e trincou os dentes, respirando em desespero. O Diorak atravessou as nuvens, e em pouco tempo a imensidão do espaço ficou visível, e aí ele parou.

— Sistema de segurança ativado – Andrew ouviu uma voz ressoar no interior da armadura – Impossível sair do planeta.

— Ah, graças a Deus – ele abriu os olhos e soltou o ar preso nos pulmões; ao ver o espaço a sua frente ele se deixou maravilhar com a imagem.

— Iniciando desligamento de emergência – disse a voz no Diorak.

— Pera aí, como é?

A armadura desligou em pleno ar e começou a cair, cortando o céu a quilômetros por hora, com Andrew gritando em desespero dentro dela.

Jildarq, o comandante Gordoniano ordenado para buscar o Diorak, contemplava o espaço a sua frente através do grande de vidro na ponte de comando. Um soldado se aproximou e fez uma reverência.

— Senhor – ele estendeu um tipo de tablet para o comandante.

— Espero que traga boas notícias, soldado, pois há muito em jogo – respondeu Jildarq enquanto pegava o aparelho.

— O Diorak, senhor, ele emitiu um sinal.

— Que sinal? – a atenção do comandante se voltou bem mais para o objeto em suas mãos agora.

— Parece que ele tentou escapar do planeta, para voltar ao seu núcleo. Mas o sistema de proteção entrou em ação, desativando o Diorak para que ele não se perca no espaço.

— Quero potência total nas turbinas! – ordenou o comandante depois de devolver o tablet para o gordoniano e seguir direto para sua cadeira de comando – Precisamos chegar à Terra o mais rápido possível.

CAPÍTULO CINCO

Em algum lugar, em alguma floresta entre a Cidade Velha e a Cidade de Ampera, Andrew se via no centro de um buraco enorme entre árvores tombadas e rachadas; ele estava deitado de braços e pernas abertas, os olhos arregalados dentro do capacete dourado. Enquanto forçava para se sentar, sentindo a dor se espalhar por seu corpo, ele viu todo seu corpo revestido do metal dourado. Ele levou a mão a cabeça e bateu contra o metal, depois até os braços, as pernas e o bumbum – tudo estava revestido com o metal.

Ele deu um grito abafado entendo que ainda vestia aquilo. Apalpando o corpo o rapaz procurou por botões ou elevações, alavancas ou qualquer coisa do tipo, o peito, as costas e até a base dos pés – não havia nada, a armadura era lisa.

— Pode me soltar, por favor? – ele perguntou, mas não houve resposta – Eu escutei você falar, sei que sabe falar! Eu não sou quem você quer. Ou sou? Ai meu Deus, eu nem sei o que você é – ele levou a mão a cabeça outra vez – Você... você tá me ouvindo? – as últimas palavras saíram num grito – Não acredito que estou falando com uma roupa esquisita.

Sem respostas Andrew simplesmente se levantou. Ele esperou o peso da roupa o atrapalhar, fazendo tropeçar e cair novamente, mas ela não parecia pesar mais que um casaco comum. De pé o rapaz pôde ver melhor o estrago a sua volta: havia um tipo de trilha de destruição onde as árvores estavam tombadas e partidas; no chão um rastro levava até o buraco onde o garoto estava.

— Mas que droga foi essa? – ele murmurava enquanto caminhava – Espera, você pode me ouvir? Eu ouvi você, seja lá o que for... Você não vai voar de

novo, ou vai? – ele abriu os braços e esperou a resposta, mas nada veio – Alô – ele alongou a palavra – Tudo bem então. Essa foi com certeza a coisa mais maluca que já aconteceu comigo – ele murmurou.

O garoto olhava a floresta, a cratera mais atrás de si e seu próprio corpo. Ele parou de repente, percebendo que estava andando sem rumo; não havia placas, estradas nem minimapa. Num segundo ele imaginou que desta vez ele era o meteoro.

— Desculpa, mas... eu não consigo ficar quieto – o garoto voltou a falar para abstrair o pensamento – Sabe... eu nem sei que droga você é, mas com certeza é alienígena. Se você for, então a vida é mais maluca do que eu pensava. E agora o mundo também é, já que você está aqui – ele parou por um segundo, suspirou e levantou os braços em rendição – Olha, eu nunca fiz nada. Sou bem gente boa. Tiro notas boas e nunca me meti com nada alienígena. Você não é nenhum tipo de juiz intergaláctico, ou é? – mais silêncio; o garoto abaixou os braços – Tomara que seus pais não estejam vindo te pegar – ele murmurou e voltou a caminhar.

Um dos escritórios da C.O.A.R, a organização a qual o Agente Miller servia, ficava no centro da Cidade Velha, escondida em um prédio comum. A C.O.A.R era responsável por cuidar dos possíveis contatos extraterrestres no país; mesmo com a Volsp tentando intervir vez ou outra em suas missões, a agência continuava seu trabalho árduo para proteger os cidadãos.

Do lado de dentro do prédio, o Agente Miller corria por entre as mesas do escritório, indo até a sala do chefe no canto mais extremo do andar.

— Chefe, tem um minuto? – perguntou Miller após bater a porta e já entrar.

— Olhe bem pra mim, Ezra, eu pareço ter um único maldito minuto? – a mesa do homem de meia idade estava cheia de papéis, além dos que ele segurava nas mãos – Entre e seja rápido!

— Obrigado chefe – o agente entrou e fechou a porta – Serei direto: soube que nossos sensores detectaram a entrada de um segundo objeto na atmosfera da Terra.

— Você soube certo, Agente Miller. A questão é: como soube, e tão depressa?

— Talvez eu só tenha mais interesse do que os outros, principalmente nos assuntos de real importância. E isso me torna qualificado, se me permite dizer.

— Talvez, já que tem a segunda maior pontuação nos testes de aptidão, testes

armados e simulação de campo.

— Eu tenho, senhor.

— Acredito então, Agente Miller, que não entrou aqui apenas para me avisar do que já sei – o chefe ajeitou os papéis com as duas mãos e os apoiou sobre a mesa, enfim dando toda atenção para Miller.

— Quero permissão para investigar esse segundo objeto não identificado – o agente respirou fundo antes de falar.

— É uma missão muito perigosa e, para uma única pessoa, com certeza suicida.

— Me envie com uma equipe.

— A equipe já está a caminho, Agente Miller. Mas, devido seu interesse tamanho e tão vigoroso esforço de participar mais nos acontecimentos recentes, vou colocá-lo em um caso investigativo – o Agente Miller não conseguiu evitar a careta de decepção – Opa, não fique tão animado!

— Desculpe senhor, mas... eu sei que posso fazer muito mais – respondeu o homem – Não quero mais correr atrás de histórias de fantasmas e chupa cabras. Permissão para falar abertamente.

— Parece que não faz outra coisa além disso – o chefe sorriu de leve.

— Quando me candidatei para esse trabalho, quando me dediquei para alcançar esse posto, eu tinha certeza que encontraria, algum dia, o que muitos consideram apenas histórias e contos de fadas; eu sempre soube que eram reais, por isso estou aqui. Tive essa certeza hoje, senhor, mas o mais próximo que cheguei foi... de uma pedra rachada. Por favor, não me afaste desse caso. E se esse segundo sinal estiver relacionado ao meteoro? E se alguma coisa realmente saiu de lá, e esse segundo objeto estiver atrás?

— São muitos “e se”, Agente Miller. Você parece mesmo empolgado com isso.

— Seria a missão da minha vida, senhor.

— Sinto muito, Agente Miller, mas a equipe já foi montada e posicionada. Mas pegue esse caso – o chefe abriu uma das gavetas, puxou uma pasta e entregou para Miller – Talvez seja um belo de um fantasma desta vez – o agente sacou a papelada de dentro da pasta e começou a analisa-la – Além do objeto detectado na atmosfera, quase que imediatamente, um segundo sinal foi captado por nossos sensores.

— Subiu até a atmosfera... – Miller murmurou.

— Não acredito em coincidências, Agente Miller – o chefe girava sua cadeira em semicírculos – O sinal e as suas últimas coordenadas serão enviados para seu celular. Essa coisa está se movendo lentamente há horas. Se aproxime devagar, Agente Miller, e faça reconhecimento. Caso o encontre, entre em contato imediatamente.

— Considere feito, Senhor.

Ao sair por entre a mata Andrew viu um grande galpão onde parecia acontecer uma convenção de heróis – ou pelo menos o que restava dela. Ele podia ver as pessoas atrás da cerca com seus uniformes e roupas coloridas.

Meio desajeitado ele escalou e saltou a cerca, caindo sem jeito e fazendo barulho de metal. Todos do lado de dentro da convenção o encararam, primeiro com estranhamento, depois com iração devido seu visual.

— Cara, por que não ou pelo portão? – reclamou um rapaz com uma prancheta na mão, talvez um dos organizadores – Malditos drogados.

Andrew se levantou e começou a caminhar para o interior de galpão. Apesar da estranheza e da dor no corpo, o rapaz agradecia por não ter encontrado uma base militar.

Ele pôde ver ao longe, acima do grande portão de entrada, uma faixa com letras de antigas histórias em quadrinhos escrita: “SkinCon, o maior festival de cosplay da cidade”.

— Mas que droga, uma convenção de nerds. Esse dia está ficando cada vez melhor – o rapaz sacodiu a cabeça e voltou a caminhar – Tomara que alguém aqui possa me ajudar – ele deslizava os olhos sobre os cosplays a procura de um guarda ou um policial, mas não encontrava nenhum.

De repente o rapaz deu de cara com um pôster emoldurado e autografado de “Matrix”, o clássico dos anos 90. Seus olhos dobraram de tamanho e por um

segundo ele esqueceu seu foco, correndo até o poster. Ele esticou a mão, mas não tocou no vidro.

— Não acredito! – ele sussurrou, a voz quase não saia de seu corpo.

— É, meu amigo, você não é o primeiro a desejar esse pôster incrível – Andrew se virou para encarar um garoto gordinho, de óculos redondos e um cosplay de Naruto – Ele é quase um chamariz – continuou o pequeno nerd – Seu preço é tão alto que ninguém pode comprar. Ele se repete nas cabines de todas as Skincons. Falando nisso, o seu cosplay é incrível.

— Ah... obrigado – respondeu Andrew.

— Deve ter demorado muito pra ficar pronto.

— Na verdade, pareceu só um segundo.

— Eu te entendo. Eu faço meus próprios cosplays, sabe? – ele remexeu a roupa laranja com orgulho – E não importa o tempo que demore, sempre vale a pena.

— Você quem fez? Ficou bem... profissional.

— Ah, obrigado. Sabe, eu me esforço muito pra...

— Olha, amigo, a conversa está muito legal, mesmo, mas eu preciso ir. Pode me dizer onde eu encontro um policial ou segurança por aqui?

— Não existem seguranças na Skincon desde a 23º edição, você não sabia? – disse o nerd enquanto ajeitava os grandes óculos.

— Não sabia – respondeu Andrew enquanto revirava os olhos, aproveitando que não podiam ser vistos através da armadura – Você sabe o endereço daqui ou então... como eu volto pra Cidade Velha?

— Tem um ponto de ônibus do outro lado da rua. Acho que o 02B te leva pra lá.

— Obrigado amigo – Andrew sorriu e deu um tapinha no ombro do pequeno nerd antes de se afastar.

— Adeus aventureiro espacial – o pequeno nerd fez um sinal de mão para se despedir – Espero que encontre o que procura.

Andrew estava animado outra vez. Saber como voltar pra casa já era um bom o. O próximo com certeza era aprender a tirar aquela coisa de seu corpo.

Do outro lado da Skincon, do lado oposto a Andrew, estava um Predador, acompanhando o rapaz com os olhos. Ele vestia sua armadura de combate e, em uma das mãos, carregava uma grande arma que mais parecia um canhão.

— Comandante, localizei o alvo – disse o Predador contra o comm-link.

— Não o perca de vista – respondeu Plediax pelo comunicador.

— Cara, eu adorei a sua fantasia – o Predador ouviu a voz de um pequeno nerd vestido de Naruto ao seu lado.

CAPÍTULO SEIS

A noite se aproximava na mesma velocidade que o furgão negro cheio de agentes C.O.A.R. Um grupo deles havia acabo de chegar a uma casa no subúrbio da Cidade Velha; havia uma faixa de polícia, viaturas e policiais ao redor dela. Ao estacionarem o furgão, seis agentes saltaram dele. Um deles, o Agente Caltren, atravessou o muro de curiosos e se aproximou de um dos policiais.

— Desculpe senhor, mas essa é uma área restrita – disse o policial de imediato.

— Meu nome é Agente Caltren, e esse é meu pessoal. Estamos aqui em nome da Agência C.O.A.R.

Todos os agentes apresentaram as credenciais em sincronia, e o policial respirou aliviado imediatamente.

— Ainda bem que vocês chegaram. Tem uma coisa lá atrás...

— Nós já sabemos, policial, foi por isso que viemos – respondeu o Agente Caltren enquanto guardava sua credencial – Onde estão os moradores?

— A casa já foi evacuada; os civis foram levados para um lugar seguro para prestar depoimento.

— Excelente trabalho. Agora, afaste seu pessoal, não deixe que nenhum civil se aproxime e, mais importante de tudo, não nos atrapalhe.

O chefe de polícia fez continência e abriu caminho para os agentes, que sacaram suas armas e seguiram até a casa. O Agente Caltren fez um sinal com a cabeça, e um segundo agente chutou a porta da frente; todos entraram em posição de tiro. A escuridão tomava o ambiente.

— Espalhem-se e fiquem atentos! – ordenou o Agente Caltren.

Os agentes assentiram e começaram a vasculhar a casa, agora com as lanternas também em mãos. Eles olharam a cozinha, os quartos, embaixo das escadas e até mesmo nos armários, mas não encontraram nada.

— Senhor, encontrei nosso alvo – o Agente Caltren ouviu falarem pelo comunicador – Está nos fundos.

— Não faça nada ainda, agente. Estamos a caminho.

Com armas em punhos todos os agentes seguiram para os fundos da casa. Havia uma grande varanda, um pequeno espaço gramado, uma piscina, um muro de pedras e uma nave espacial – o alvo da missão. O Agente Caltren sorriu e sacou seu celular.

— Aqui é o Agente Caltren reportando sobre a missão de reconhecimento do segundo objeto: encontramos o objeto que entrou na atmosfera. Ele está

aterrissado nos fundos de uma casa no subúrbio da Cidade Velha. Reforços não são necessários; não parece ter ninguém aqui. Vamos enviar fotos para análise técnica, mas se quiserem que alguém entre lá, então vão sim precisar mandar mais gente. Câmbio e desligo.

— Quer dizer que eles estão por aí, senhor? – questionou um dos agentes.

— Pelo menos não estão aqui – respondeu um terceiro, abaixando de leve sua arma – Ou talvez todos tenham morrido quando isso caiu.

— Isso não caiu, agente, foi estacionado – respondeu Caltren – E o importante é que ninguém se feriu. Vamos logo com as evidências pra irmos embora daqui.

De repente um tiro de energia atingiu o Agente Caltren no peito, lançando-o para dentro da piscina. Os outros agentes se viraram na direção de origem do tiro. Subitamente um Predador surgiu perto deles – ele usava uma armadura prateada e estava pronto para lutar. Os cinco agentes abriram fogo; as balas atingiam a armadura sem nenhum efeito. O Predador atirou então entre dois agentes, lançando um para trás e o outro pra dentro da casa, atravessando a porta de vidro. Num salto a criatura se aproximou de um agente, o agarrou pelo terno e jogou por cima da casa.

O Predador encarou os dois homens ainda de pé e exibiu suas presas num tipo de sorriso. Um dos agentes abriu fogo novamente enquanto o outro corria na direção da saída. O Predador levantou sua arma na direção do que corria e o atingiu nas costas, arremessando-o pela porta da frente.

Do lado de fora os policias e os curiosos se espalharam em desespero.

— Precisamos de reforços – falou o policial através do rádio – Mandem o máximo de pessoas possível.

Na batalha nos fundos da casa o agente ainda de pé continuava atirando contra o extraterrestre. O Predador saltou sobre o homem e o derrubou, o segurou pelo pescoço e arremessou contra a nave pousada. O Predador pôde ouvir, do outro lado da casa, os gritos e o som de viaturas.

O Predador olhou os inimigos caídos ao redor e aproximou da boca o comm-link preso em seu braço. Antes que pudesse dizer qualquer coisa, o agente arremessado pela porta de vidro se levantou, sacou um explosivo e arremessou contra o Predador. A explosão feriu o Predador, fazendo-o gritar de dor e perder o equilíbrio. Assim que recuperou o equilíbrio, o Predador levantou sua arma e atirou contra o agente, fazendo-o girar no ar.

A armadura do Predador agora estava danificada e seu rosto queimado, com sangue azul escorrendo.

— Reydan reportando: fomos descobertos, senhor – disse o Predador junto de seu comm-link – Precisamos nos apressar na captura do Diorak. Reydan desligando.

CAPÍTULO SETE

Ao se preparar para descer do ônibus, de frente para sua casa, Andrew percebeu o motorista o encarar de cima a baixo com uma careta.

— Eu vim da Skincon – disse o garoto, mas o motorista nada respondeu – Tá certo... boa noite então.

O rapaz desceu o mais rápido possível para fugir do constrangimento. Ao encarar sua casa percebeu que não poderia entrar pela porta da frente, então correu para os fundos com suas adas de metal. Ele fez força para escalar o pequeno pilar que segurava o teto da varanda – a mesma força que fazia antes, quando não usava aquela armadura dourada –, subiu no telhado e então ou pela janela do seu quarto, no segundo andar da casa, fechando a janela com cuidado para não fazer barulho.

— Sem viaturas, helicópteros nem jatos militares... meu pai nem reparou que saí voando – ele ficou um pouco decepcionado – Meu sono pesado deve ser genético então.

Por horas a fio, noite a dentro, Andrew caminhou de um lado para o outro pelo quarto, pensando e testando teorias para fazer aquela armadura sumir assim como apareceu, e, de preferência, voltar a ser seu celular – tinha muita coisa salva lá.

Depois de um tempo ele não pôde mais resistir e caiu no sono.

Andrew acordou com seu pai batendo na porta do quarto. O rapaz estava deitado no chão logo ao lado da cama, deitado sobre o braço direito, sem a armadura. Ao perceber que seu braço estava limpo ele se averiguou por inteiro: sua camisa e seu short estava de volta, assim como suas mãos e pés descalços. Por reflexo ele deu um grito, e por reflexo o Sr. Galadaz entrou no quarto.

— Pai, que isso? – disse Andrew, puxando o cobertor de cima da cama para se tapar, como se quisesse se esconder.

— Você gritou, então eu... – respondeu o Sr. Galadaz apontando para porta.

— Desculpa. Acho que foi só... um pesadelo.

— Tudo bem, filho... depois do que você ou.

Andrew arregalou os olhos ao lembrar do acidente na praça. As coisas na última noite foram tão esquisitas que havia se esquecido daquele pequeno detalhe.

— Obrigado, pai – respondeu o rapaz.

— Vem, vamos comer alguma coisa.

O Sr. Galadaz se virou e seguiu caminho até a cozinha. Andrew, ainda no quarto,

se olhou por completo outra vez para ter certeza de que aquela coisa havia sumido. Ele sorriu ao não ver a armadura, mas então um novo medo o acometeu: onde ela havia ido parar? Ele não conseguia parar de se perguntar aquilo enquanto descia as escadas até a cozinha.

Não havia nada de luxuoso para o café da manhã, apenas uma xícara de café para cada um e uma cesta com pães. Mas a normalidade foi exatamente o que tranquilizou ainda mais o rapaz.

— Sabe filho, acho que não deveria ir à escola hoje.

— Eu nem estava pensando nisso – Andrew respondeu ainda com a boca dentro de sua xícara.

— Imaginei que depois do que aconteceu com vocês na praça, a última coisa que você iria querer pensar era na aula de química.

O rapaz quase cuspiu seu café quando um pensamento o atingiu: e se aquela coisa não tivesse sumido de fato? E se estivesse dentro dele? Andrew se lembrou vagamente do que havia ouvido numa das aulas de química: “ A simbiose é uma relação ecológica que ocorre entre indivíduos de espécies diferentes... no relacionamento simbiótico ambas as espécies dependem da presença do parceiro ”.

Se aquela coisa estivesse mesmo dentro dele... O laboratório. A Cidade Velha podia ter vários defeitos, mas a boa educação era incomparável. Sua escola era munida de um belo laboratório de química – pelo menos para os padrões de um aluno do ensino médio. Talvez pudesse usar o laboratório para descobrir mais sobre aquilo, e na melhor das hipóteses, até se livrar dele.

— O que aconteceu? – perguntou o Sr. Galadaz.

— Nada, nada não, eu só... me dei conta de uma coisa.

— Ah... – o Sr. Galadaz apoiou sua xícara na mesa e pigarreou antes de continuar. Eu sei que é difícil, mas não fique tão abalado. Tenho certeza que logo vamos receber notícias sobre o estado dela. E boas notícias.

A imagem de Natália então veio a mente do rapaz. Ele precisava vê-la, saber como estava... mas aquela coisa nele... e se ela tomasse seu corpo outra vez? E se fizesse perto da amiga ou do pai? E se saísse voando sem parar até o espaço desta vez?

— Bem... vou separar uns filmes para nossa maratona de hoje – o Sr. Galadaz deu uma grande golada em seu café antes de se levantar.

— Na verdade, pai... acho que eu vou pra escola – Andrew encarava a xícara em suas mãos, como se olhasse nos olhos da decisão mais difícil da sua vida – Acho que eu preciso... de um pouco de normalidade agora.

O homem forçou um sorriso, voltou até o filho e apoiou a mão em seu ombro.

— As coisas vão melhorar, filho. Eu prometo.

— Valeu pai.

O Sr. Galadaz seguiu para seus afazeres enquanto Andrew deu o último gole em seu café, engolindo coragem para cumprir seu plano.

Da porta Andrew se despediu do pai e seguiu caminho para escola, pronto para cumprir seu plano. Estacionado do outro lado da rua estava um carro acinzentado, com um agente sentado no banco do motorista.

— Aqui é o Agente Miller, relatando sobre a missão de reconhecimento – disse Miller contra o celular sem tirar os olhos de Andrew – Segui o sinal, mas... não tenho certeza de sua origem. Vou seguir com a missão.

CAPÍTULO OITO

Andrew seguia feroz pelo corredor da escola por entre os adolescentes; sem parar por nada nem ninguém, indo direto para o laboratório de química no fim do corredor. Quase por milagre o lugar estava vazio.

— Acho que não sou o único que não gosta de química – murmurou Andrew enquanto fechava a porta.

O rapaz lavou as mãos, pegou uma lâmina de vidro e, em sua mochila, pegou uma tesoura.

— Beleza – ele secou o suor da testa com a camisa – Etzinho, etzinho... eu não sei rimar, mas aparece, por favor.

Ele encarou uma das mãos, tendo cada vez mais certeza que a coisa ainda estava dentro de si. O rapaz fechou os olhos e ergueu a mão direita, quase que pedindo que aquela coisa fizesse o favor de aparecer – e funcionou. Ao abrir os olhos novamente ele viu a mão direita tomada por uma cobertura dourada. Ele foi rápido dessa vez, quase imprudente, estendendo um dedo e cortando a ponta, como se cortasse uma unha, tirando uma lasca da armadura.

— Funcionou? – o rapaz encarava a lasca sobre a tesoura – Que fácil.

Assim que Andrew tocou a lasca dourada na lâmina de vidro no microscópio, ela

voltou pra sua forma gosmenta. O rapaz ficou em posição para olhar pelo microscópio. Ele já havia visto células antes, pintadas durante as aulas de biologia, mas nada como aquelas... coisas. As pequenas células iam pra lá e pra cá, todas douradas e luminosas como neon.

— Que droga é você?

O rapaz se afastou do microscópio para pensar melhor. Num segundo a lasca dourada expandiu, derretendo além da lâmina. Andrew deu um o para trás, com o pensamento a mil por hora; ele pegou uma placa de Petri, empurrou a lâmina para dentro e a tampou.

Dentro da placa a lasca parecia tentar sair, se batendo em todos os lados. Ele segurou a placa com mais força e pegou uma fita na mochila, adesivando toca a placa ao redor. Assim que lacrou ele a jogou dentro da mochila e respirou, não queria que aquela coisa o possuísse novamente. Ele sacudiu a mão até ela voltar ao normal também.

Depois de respirar um pouco, Andrew vestiu a mochila de volta e correu para fora da escola, se esforçando para não tocar em ninguém no corredor.

Andrew jogou sua mochila sobre a cama e começou uma discussão com a Placa de Petri em mãos.

— Qual é a sua? Não bastou cair encima de mim e da minha amiga, agora também quer infernizar minha vida? O que você é? Por que não sai de mim? Por que entrou em mim? O QUE VOCÊ QUER?

— Só queria conversar.

O rapaz se espantou e se virou para o pai esperando de pé na porta do quarto, como sempre com uma xícara em cada mão.

— Oi, desculpa pai – Andrew se abaixou e jogou a placa de petri de volta na mochila – Eu não vi você aí.

— Tudo bem – o Sr. Galadaz entrou e estendeu uma xícara para o filho – Você parecia irritado.

— Só com... o dever de casa – o rapaz pegou a xícara e se levantou – O senhor estava certo, ainda não tá na hora de voltar pra escola.

— Sinto muito por isso.

Eles se sentaram juntos na cama da ponta, um do lado do outro.

— Olha filho, eu não vou dizer que sei o que você está ando – o homem pensou um pouco antes de continuar – Mas o que eu sei é que nenhum mal é pra sempre. Uma hora isso vai ar, tudo vai se consertar e, quando acontecer, e a normalidade voltar, você nem vai se lembrar de quando foi dificuldade. Só precisa manter a calma, se concentrar e... ser paciente.

— Tem razão; é só isso – a iluminação voltou a mente de Andrew – Eu só preciso ter calma e... concentração; paciência. Só assim vou me resolver com essa coisa.

— É o que eu estou dizendo.

Ambos deram uma golada sincronizada na bebida. Ela era gelada, então Andrew não teve medo ao beber. Mas o gosto era estranho, e ele logo cuspiu de volta pra xícara o que ainda não havia engolido.

— Do que é feito esse troço?

— Só bebe – respondeu o Sr. Galadaz dando mais uma golada em sua bebida.

Parado há alguns metros dali o Agente Miller ainda esperava em seu carro, observando a casa de Andrew. Ele sacou seu celular mais uma vez:

— Aqui é o Agente Miller, relatando em relação ao sinal do primeiro objeto. Parece que está com uma pessoa. Preciso de reforços caso seja...

Seu telefone apitou no mesmo segundo que Andrew saiu da casa com uma sacola de lixo nas mãos. Miller abaixou o celular para conferir: havia um contador emitindo um sinal enorme de energia. O agente levantou os olhos pro garoto.

— Mas quem é esse garoto? – Miller encarou o aparelho outra vez; a contagem energética era equivalente a de uma usina nuclear ativa.

Enquanto caminhava até a lata de lixo – a maior caminhada até a lata de lixo que já havia feito – Andrew tentou mais uma vez entrar em contato com a armadura. Ele sabia que ela o podia ouvir e até falar; ele a faria falar de novo.

— Tá bem, olha, eu ainda não sei quem ou o que você é, mas eu preciso resolver isso – ele sussurrava para não chamar atenção – Ou melhor, a gente precisa – o rapaz olhou para os lados para ter certeza que nenhum vizinho o via falando sozinho – Eu sei que você é vivo, ouvi você falar comigo. Então só... diz o que eu tenho que fazer pra você ir embora que eu faço. Não precisamos ser inimigos.

Andrew alcançou a lata de lixo antes de ter uma resposta. Ele jogou o saco lá dentro e bateu a lata com força.

— Tá certo, eu descubro sozinho – ele falou alto desta vez, sem se importar se iam ouvi-lo ou não.

Antes do garoto terminar a volta o carro do Agente Miller parou ao lado seu lado, junto a calçada. O vidro estava semi-abaixado, e o agente já estava com a arma em mãos apontada para o garoto.

— Parado! – ordenou Miller.

— Pode levar tudo, cara – Andrew levantou as mãos em rendição – Mas meu celular nem é tão bom assim. Eu nem sei mais se tenho um celular. Quer saber, leva o celular.

— Você não tá entendo garoto: você tá preso – o agente abriu a porta e saiu, sempre apontando a arma para o rapaz.

— O que? Por quê?

— Por roubar algo que me pertence – o homem segurou os braços de Andrew e prendeu seus pulsos com uma algema.

— Eu nunca roubei nada, e nunca nem te vi – o rapaz foi empurrado pelo agente, forçado a entrar no carro no banco do ageiro – Pegou o cara errado.

— É o que todos dizem – o homem bateu a porta do carro antes de se virar e voltar para o banco do motorista.

O Agente Miller entrou e acelerou o carro num segundo, seguindo em direção a Base C.O.A.R. Ele sacou seu celular outra vez e voltou a relatar:

— Aqui é o Agente Miller, entrando em contato com relação ao sinal do primeiro objeto. Diga ao chefe que eu já resolvi o problema; não era nada perigoso. Cancelem os reforços – ele olhou para Andrew com desdém por um segundo – Estou levando o objeto roubado para a base de operações científicas.

— Base de operações? Que base de operações?

— Câmbio e desligo – a careta de Miller fez uma careta para o rapaz mostrava que estava ofendido pela interrupção do garoto.

— Olha... Agente Miller, eu não faço ideia do que você tá falando, eu juro.

— Cala a boca garoto. Eu não preciso ler seus direitos, mas aquilo de “ser usado contra você no tribunal” está valendo.

— MAS EU SOU INOCENTE – Andrew gritou, e o olhar do agente o fez diminuir de imediato; depois de engolir o seco ele prosseguiu – Essa semana está inteira uma maluquice. Depois de me ferrar todo com a queda daquele maldito meteoro e meu celular virando um troço que tomou meu corpo eu... eu... nem sei mais se estou acordado, ou vivo.

O agente freou o carro bruscamente.

— Você disse que o seu celular tomou seu corpo? – perguntou Miller já se virando para Andrew.

— Disse – o rapaz também se virou para o agente – Eu sei que parece loucura, mas é verdade. Parecia...

— Você disse que estava lá quando o meteoro atingiu o parque. Foi um dos feridos?

— Sim, mas quase nada. Fiquei desmaiado por umas horas.

— Nenhum dos feridos se aproximou do local da explosão após a quarentena – Miller murmurou antes de sacar o celular outra vez – Aqui é o Agente Miller. Preciso da lista de nomes de todos os feridos no incidente J28.6 – o agente assentiu para o vazio, virou o aparelho para os olhos e começou a remexer uma lista – Qual seu nome garoto?

— Andrew Machado Pinto.

— Que nomezinho infeliz.

— Nem me fala.

O Agente Miller logo encontrou o nome de Andrew na lista de feridos do incidente na praça. Ele encarou o rapaz por um segundo, bufou e guardou o celular.

— Que foi? – perguntou Andrew, tão ansioso quanto aquela semana o proporcionava ficar.

— Vou te dar um voto de confiança, garoto – o Agente Miller se aproximou e soltou as algemas do rapaz – Não faça eu me arrepender.

Ele ligou o carro outra vez, acelerou e fez a volta.

— Se não se importa que eu pergunte, agente... aonde nós vamos agora? – disse Andrew enquanto massageava os pulsos.

— Vamos tomar um sorvete – respondeu Miller.

CAPÍTULO NOVE

A lanchonete estava meio vazia àquela hora da tarde; Andrew e Miller dividiam uma mesa quase no centro do local, sentados de frente um pro outro. A mesa que estavam dividia duas janelas, pegando a ponta de cada uma, dando visão para ambos para a rua do lado de fora. Nas mãos de Andrew havia um copo de milkshake pela metade, enquanto o do Agente Miller estava intocado sobre a mesa.

— E foi isso; quando você me prendeu eu tinha acabado de conseguir esconder essa coisa – depois que terminou todo resumo da história mais maluca da sua vida, Andrew deu mais uma golada no milk-shake.

— E então ela desapareceu? – perguntou o agente, e Andrew apenas murmurou em resposta – Incrível. Deve ser um tipo de tecnologia inteligente. Você disse que ela falou, não é?

— Falou, mas foi só uma vez – o rapaz limpou a boca com os dedos – E tinha uma voz firme, então deve ser ele .

— E o que ele disse?

— Disse “sistema de segurança ativado”, e aí eu despenquei. Engraçado é que... é como se fosse uma língua maluca dentro da minha cabeça, e eu entendi perfeitamente.

— Talvez tenha desligado então – Miller remexia o canudo em seu copo enquanto pensava – Por isso você conseguiu manipula-la com tanta facilidade.

— Facilidade? Eu fiquei a noite inteira tentando tirar isso de mim, e ainda não consegui.

— É, mas você caminhou, pegou o ônibus, e até a fez desaparecer só de pensar nisso. A questão aqui é: quando tentou sair da atmosfera, a armadura entrou em um sistema de segurança que provavelmente emitiu um sinal. E alguma coisa seguiu esse sinal, e entrou na atmosfera durante a madrugada... Preciso fazer uma ligação!

O homem sacou o celular mais uma vez, pronto para começar outra ligação. Andrew sorriu; aquele homem parecia ficar mais no celular do que um policial normal deveria – até mesmo do que o próprio rapaz. Ele levou o copo de milkshake à boca mais uma vez, olhando pela janela enquanto sonhava com a liberdade. O canudo desprendeu de seus lábios com a visão que teve: parados bem no meio da rua havia meia dúzia de Predadores, todos vestidos com uma armadura acinzentada, armas como canhões em uma das mãos e mochilas a jato nas costas, voando alguns metros do chão.

— Ammmm... Agente Miller.

— Agora não, garoto.

Andrew bateu algumas vezes no vidro até o homem se virar para olhar. Ao ver a cena o Agente Miller também paralisou, mas não de medo, e sim por atenção.

Do lado de fora os Predadores olhavam diretamente para Andrew pela janela da lanchonete.

— Comandante, encontramos o Diorak – disse um deles pelo comm-link – Iniciando captura.

Dentro da lanchonete, as poucas pessoas lá dentro pareceram enfim entender a situação que estava se formando. Elas começaram a resmungar, se levantar para sair e até a tirar fotos das criaturas. O Agente Miller sacou sua arma com calma enquanto guardava o celular.

— Andrew, é melhor se preparar.

— Pra...? – o rapaz não conseguia tirar os olhos das criaturas.

— Pra correr; correr muito.

Um Predador mais ao centro da fila horizontal fez um sinal de mão, e o mais a ponta imediatamente voou na direção da lanchonete, atravessando o meio da janela ao lado da mesa por entre o rapaz e o agente. Andrew e Miller se jogaram no chão, deixando o Predador ar direto, atingindo a parede do outro lado do balcão de atendimento.

— PROS FUNDOS, AGORA! – ordenou Miller, e Andrew assentiu.

As pessoas já corriam de um lado para o outro a essa altura. Andrew e o Predador ficaram de pé ao mesmo tempo. O Agente Miller virou uma mesa, se abaixou ao lado dela e abriu fogo na altura da cintura da criatura, mas as balas não fizeram efeito. O Predador se virou para o agente e atirou – uma bala arredondada de energia azul que estourou contra a mesa que servia de escudo para o homem. O impacto jogou Miller e a mesa para trás, fazendo atingir a parede e perder as forças por um segundo.

Andrew já havia alcançado a porta traseira a essa altura, mas uma mão com garras o segurou e ergueu pelo colarinho.

— Entregue o Diorak! – ordenou o Predador, virando o garoto para olha-lo nos olhos.

— Eu nem sei repetir esse nome, cara – Andrew se sacodia para tentar se soltar.

O Agente Miller atirou outra vez, atingindo a cabeça do Predador que segura Andrew. A criatura soltou o rapaz por reflexo e levantou sua arma contra o agente. Andrew se ergueu rápido e empurrou a arma do Predador para cima, fazendo o tiro explodir no teto da lanchonete. O Predador segurou Andrew pelo braço e o jogou contra o chão, apontando sua arma para o rapaz. Miller aproveitou a oportunidade para um ataque mais forte, puxando uma das pequenas bombas de seus equipamentos e jogando contra o Predador, que o segurou no ar. Quando a bomba apitou repetidas vezes, Andrew se protegeu, e ela explodiu.

A explosão lançou o inimigo para longe, causando um estrago no chão, nas paredes e no teto da lanchonete, iniciando um pequeno incêndio atrás do balcão.

O Agente Miller se levantou e correu até Andrew, pegando-o pelo braço e fugindo para a cozinha nos fundos do local.

Enquanto ainda corriam por entre prateleiras e balcões, o Predador os alcançou outra vez – sua armadura estava partida e rachada em algumas partes –, segurando Miller pelo braço e lançando-o para trás outra vez. O inimigo levantou o canhão outra vez; o Agente Miller não parecia ter forças para agir desta vez. Andrew sabia que precisava agir, precisava salvar o agente; ele sentiu poder correr por seus braços e suas mãos ficarem douradas com o metal outra vez; ele se levantou correu contra o Predador, empurrando-o tão forte que o fez voar por todo local, atravessando a parede até o prédio ao lado.

Por um segundo, tanto Andrew quanto Miller iraram o feito, o homem olhando o buraco na parede e o rapaz as mãos, deixando de ser douradas aos poucos.

— A gente precisa ir, cara! – disse Andrew, estendendo a mão para o agente no chão.

— Mandou bem garoto – Miller pegou a mão do garoto e se levantou – Como fez aquilo?

— Eu não sei. Só sei que funcionou.

— É o suficiente.

Eles voltaram a correr, fugindo pelos fundos, correndo direto para o carro do Agente no estacionamento. Num segundo o carro saiu em disparada pelas ruas da cidade.

— Acho que despistamos eles – disse Andrew, olhando por cima do ombro.

— Aqui é o Agente Miller, preciso de reforço na minha posição! – o homem falava contra o celular outra vez – Código vermelho! Repetindo, código ver...

Uma explosão logo atrás do carro interrompeu o homem. Ao se virar, o Agente Miller percebeu uma dezena de Predadores voando em perseguição. Mais um tiro de um dos inimigos, desta vez ao lado de Miller na estrada.

— O CARRO É DA EMPRESA, IDIOTAS – ele gritou – Se segura, garoto.

O carro acelerou a centenas de quilômetros por hora, desviando dos outros veículos na rua quase em desespero. Os Predadores não ficaram para trás.

— Assim você vai matar a gente – Andrew se apoiava em todas as partes que podia no carro.

— Essas coisas vão matar muita gente se não sairmos da cidade – disse Miller antes de fazer uma curva fechada, desviando de mais um tiro – Garoto, você disse que caiu do espaço vestindo aquela coisa, certo? – a estrada que pegou levava ao litoral, e num segundo ou de pequenas construções para um campo verde e aberto.

— Eu não cheguei a chegar ao espaço, mas...

— E ela sumiu quando você mandou, não é?

— Sim, mais ou menos.

Mais um tiro foi dado, fazendo o carro sacudir outra vez.

— Precisa trazê-la de volta, Andrew! A força que você demonstrou lá atrás não é sua, é dela. Com ela completa você vai poder lidar com todos eles.

— Eu não a quero de volta – respondeu o rapaz – Sabe o esforço que foi pra ela sumir?

— Não se trata do que você quer, se trata de se manter vivo. TRAGA ELA DE VOLTA, AGORA!

Andrew bufou e fez uma careta de desgosto, fechou os olhos e os punhos, e se concentrou. Ele quase suplicava em sua mente para a armadura retornar, algo que achou que não faria nunca. Ele tentava relaxar como havia feito na escola, o único momento que havia feito uma parte daquela coisa surgir por pura e espontânea vontade. A armadura de metal se espalhou por seu peito, cobrindo todo o corpo do rapaz num segundo.

— AHA! – gritou Andrew antes de se levantar e arrebentar o teto do carro, virando-se pros inimigos – Preciso de uma arma, Agente Miller – antes que o homem pudesse fazer qualquer coisa, os braços do garoto viraram dois canhões, como ar armas dos inimigos – Acho que estou começando a me entender com esse negócio.

Ele começou a atirar contra os inimigos, que desviavam dos ataques sem maiores problemas. No terceiro tiro ele atingiu uma criatura, fazendo-a rodar e atingir a segunda ao seu lado. Um Predador atirou de volta, acertando a cabeça de Andrew. Furioso, o rapaz desfaz as armas e saltou na direção da criatura que o atingiu, pegando-o no ar e derrubando-o contra o chão.

Os outros Predadores pararam, assim como o carro do Agente Miller alguns metros a frente; o agente saltou e se escondeu atrás do veículo. Um Predador pousou atrás dele no segundo seguinte, segurando-o pelo ombro e jogo-o contra o chão. Com o pé a criatura o impediu de se levantar.

Alguns metros atrás Andrew ficou de pé, segurou o Predador caído e o jogou contra os outros, atingindo um dos que estavam no ar. Os outros pousaram ao redor do rapaz, cercando-o num semicírculo. O número de inimigos parecia aumentar cada vez mais, com mais deles se aproximando a cada segundo. Um dos Predadores que pousou ao redor de Andrew vestia uma armadura diferente, com partes douradas, um brasão e um capacete como coroa – era Plediax, o Comandante Predador.

Ele caminhou por entre os outros e parou de frente para Andrew que, meio sem jeito, entrou em posição de ataque.

— Portador do Diorak, eu sou Plediax, Comandante dos Predadores. Com a autoridade concedida a mim, ordeno que devolva o Diorak.

— Você quer? Vem pegar – disse o rapaz ofegante.

Plediax fez um sinal de mão e os Predadores começaram a atirar no garoto. Andrew levantou as mãos formando um escudo num segundo de pensamento. Ele foi se ajoelhando aos poucos devido os impactos constates. Por fim Plediax ergueu sua mão mais uma vez, e os tiros pararam. Ele se aproximou de Andrew, que agora estava ajoelhado no chão, e o segurou pelo queixo.

— Sinto muito, garoto – disse Plediax – Levem-no!

Os Predadores se prepararam. Repentinamente cinco robôs enormes pousaram em volta do grupo de Predadores. No centro, atrás de um de vidro, havia um cockpit que deixava o piloto Gordoniano a mostra. Cinco dos Predadores foram abatidos num segundo, e os outros alçaram voo.

— RETIRADA! – ordenou Plediax.

Os Predadores voaram para longe – incluindo o que segurava Miller contra o chão. Os Gordonianos, criaturinhas verdes de olhos pretos enormes, dentro de suas armaduras, se aproximaram para ajudar Andrew a se levantar.

— NÃO CHEGA PERTO! – gritou o rapaz.

— Calma garoto, viemos ajudar – disse um dos Gordonianos, a armadura levantando a mão em rendição – Estamos do mesmo lado.

— Que lado? Do que está falando?

— Se meteu em uma coisa muito grande – respondeu um segundo ET verde dentro da armadura enorme – Se vier conosco, poderemos ajuda-lo, e explicar tudo que precisa saber. Podemos até tirar o Diorak de você.

O Agente Miller se aproximou em posição de tiro; os Gordonianos levantaram suas armas.

— Abaixem as armas! – disse Andrew, relaxando sobre o chão outra vez – Ele é meu amigo.

— Andrew, vem logo pra cá! – ordenou o Agente Miller, ainda com a arma em punhos.

— Eu... não posso, Agente Miller.

— Do que tá falando, garoto?

— Eles disseram que podem me ajudar; que podem tirar essa coisa de mim. É tudo o que quero.

— Não podemos deixar que essa coisa caia nas mãos de qualquer um, Andrew.

— Já caiu, Agente Miller, nas minhas. E eles me salvaram daqueles...

— Predadores – disse uma das criaturinhas verdes – E nós somos Gordonianos – a criaturinha sorriu.

— Obrigado. Eles não nos atacaram, mesmo agora com você apontando uma arma pra eles.

— Não faça uma escolha precipitada baseada nas emoções, garoto.

— Sinto muito, agente – Andrew se levantou com certa dificuldade – Eu já me decidi. Podem mesmo tirar isso de mim?

— Absolutamente – respondeu um dos seres verdes.

Helicópteros surgiram no horizonte, fazendo um barulho tão alto quanto das armaduras antes deles. Miller logo os reconheceu, até mesmo dando um sorriso de alívio.

— Precisamos ir agora! – ordenou o Gordoniano um segundo antes de voar.

Os Gordonianos todos alçaram voo no segundo seguinte; Andrew deu uma última olhada no agente, como quem dissesse “sinto muito” antes de seguir os

ETs. O Agente Miller enfim abaixou sua arma. Cabisbaixo e preocupado, ele encarou as armaduras subirem ao céu e desaparecerem no meio do nada.

CAPÍTULO DEZ

Andrew caminhava irado pela enorme nave alienígena, seguindo os pequeninos Gordonianos a sua frente – todos, exceto Andrew, estavam fora de suas armaduras de combate; o rapaz não a tiraria nem se soubesse como fazer já que ainda não confiava totalmente em seus novos “aliados”; suas experiências com ETs não haviam sido das melhores até então.

— SENTIDO! – Andrew ouviu alguém gritar de repente, e até o rapaz ficou em posição.

Em meio ao pequeno corredor de criaturinhas verdes, Andrew viu um deles se aproximar; esse era diferente, não vestia o uniforme cinza característico – como a maioria a sua volta – ou os azuis e verdes que havia visto poucas vezes, mas sim um dourado, com um brasão preso ao braço.

— Então é você o humano de que tanto ouvi falar – disse o comandante ao se aproximar do rapaz – Eu sou Jildarq, comandante desta nave, um dos mais condecorados de Gordon. Nós, Gordonianos, temos uma dívida eterna com você, humano.

— Gordonianos... – o rapaz relaxou de sua posição aos poucos – Me desculpem, é que... ainda é tudo tão estranho. Ontem eu acordei decidido que ia chamar a garota que eu gosto pra sair, e agora estou numa nave extraterrestre vestindo... uma armadura dourada superpoderosa.

— Sua confusão e medo são compreensíveis – Jildarq se virou e começou a caminhar – Mas elas logo arão, e você poderá voltar para sua garota que gosta, se confiar em mim.

— Vai tirar essa coisa de mim? – Andrew começou a segui-lo, e o corredor de gordonianos foi se desfazendo.

— Essa sempre foi a ideia – respondeu o comandante, o novo guia do garoto pela nave.

— E depois vai me deixar ir?

— Mas é claro que sim – Jildarq pareceu espantado com a pergunta – Por que o manteríamos aqui? – Andrew e o comandante apenas se encararam por um tempo, até que o ET quebrou o gelo – Levem-no para sala de extração.

Um Gordoniano de cinza se aproximou e estendeu a mão, guiando Andrew por um novo corredor, com um grupo seguindo-os atrás. Ao entrar num elevador, vendo Jildarq o encarar ao longo do corredor, Andrew teve um mal pressentimento sobre aquilo.

A nova sala para onde Andrew foi levado estava cheia de gordonianos vestidos de verde, e a luz azulada das centenas de telas no ambiente fazia uma pequena confusão na mente do rapaz; um grupo de painéis de controle fazia um C na borda oposta a porta de entrada, e no centro havia um círculo luminoso desenhado no chão.

— Que lugar é esse? – perguntou o rapaz enquanto irava o que seus olhos podiam alcançar.

— Aqui é onde tiraremos esse grande fardo de seus ombros, criança – Andrew ouviu a voz do comandante ecoar por toda a sala; o homenzinho verde falava da sala de comando.

Um Gordoniano vestido de verde, carregando numa mão um pequeno bastão e na outra um tipo de tablet, se aproximou de Andrew e o analisou de cima a baixo com o bastão. O rapaz se retraiu até o processo terminar, e o gordoniano se esticou para alcançar o topo da cabeça do garoto.

— Comandante, parece que o Diorak já o assimilou por inteiro – disse o gordoniano ao céu enquanto analisava as informações no tablet – E está começando o processo de unificação com o DNA humano.

— Isso é ruim? – perguntou Andrew num murmúrio.

— A separação ainda é possível? – questionou o comandante.

— Completamente, senhor.

— ESPERA SÓ UM MINUTO – gritou Andrew enquanto balançava as mãos – Vocês ficam falando como se eu não estivesse aqui, o que é difícil por que literalmente estou vestindo dourado aqui – todos tinham a atenção do rapaz – Vocês me prometeram respostas e ajuda, e até agora eu só vi e ouvi coisas sem explicação. Às vezes eu até duvido que seja real – ele levou a mão ao peito e murmurou – Será que estou em coma?

O garoto deu dois os para trás e se apoiou na parede.

— Eu só posso imaginar como deve ser difícil rapaz – Andrew ouviu a voz do comandante novamente – Mas eu posso garantir que tudo que está vivendo é real, e de séria importância. Essa tecnologia dentro de você, o Diorak, é uma das armas mais poderosas desse setor galáctico. Infelizmente, durante uma batalha contra os Predadores, aqueles serem que o atacaram mais cedo, o Diorak precisou se perder nas estrelas; até que você o encontrou.

— Ele meio que me achou, na verdade – respondeu Andrew, ainda com os olhos vidrados no chão.

— O que importa é que, o encontro de vocês nos trouxe aqui, e agora estamos prontos para toma-lo de volta. Você está?

Andrew pensou por um segundo, respirou fundo para reunir coragem e se decidiu:

— Com certeza – ele se levantou devagar, tomado pelo cansaço da fuga e do estresse – Só me diga o que fazer.

— Apenas vá até o centro do círculo – respondeu o gordoniano com o tablet na mão – E não se mova – Andrew assentiu e caminhou até o centro da sala, e todos os gordonianos começaram seus trabalhos nos painéis ao redor; o gordoniano se aproximou outra vez enquanto remexia em algo em seu tablet – Você vai sentir um leve desconforto.

— Certo – respondeu o rapaz – Mas numa escala de 1 a 10, sendo 1 a picada de uma vacina e 10 a pior dor do mundo... – não houve resposta, o gordoniano apenas seguiu caminho encarando o tablet – Tudo bem, eu prefiro não saber mesmo.

O Gordoniano apertou um botão virtual em seu tablet e o procedimento começou. Um cilindro de energia como vidro surgiu em volta de Andrew num segundo; era tão fino que o rapaz mal podia se mover.

— Preparados comandante – falou o gordoniano com o tablet ao se aproximar do de controle central da sala – Mas devo avisar que o processo ativará o Diorak por três segundos antes da retirada.

— Não será o suficiente para que reaja – respondeu Jildarq – Prossiga com a extração.

Uma luz forte se acendeu sob os pés e sobre a cabeça de Andrew, e o rapaz

levitou alguns centímetros, como se a própria gravidade tivesse sido anulada. Ele ouviu bipes consecutivos em sua mente antes de uma voz familiar falar:

— Reinicialização completa.

— Opa, você voltou – Andrew sorriu.

De repente, diante de seus olhos, todos os Gordonianos na sala foram marcados com um triangulo vermelho.

— Inimigos detectados – disse o Diorak com sua voz metálica.

— Como assim...? – a voz do rapaz foi cortada num segundo.

Andrew ou a gritar de dor enquanto o Diorak era sugado de dentro de seu corpo, puxado por entre seus músculos e ossos como um pano preso a uma queimadura; no fim a armadura se desfez e o Diorak voltou a ser apenas um tipo de gosma, sendo sugado direto para o teto. As luzes se apagaram e o cilindro desapareceu, deixando o garoto cair desmaiado no chão frio da nave.

— O procedimento foi um sucesso, comandante. O Diorak foi completamente removido do humano.

— Excelente – respondeu Jildarq; dava para sentir o sorriso em seu rosto pelo tom de sua voz – Agora descarte-o e comecem uma invasão! Será a prova de

poder do Diorak.

O Agente Miller continuava parado na estrada, apoiado no capô do carro encarando os helicópteros que rondam a cidade agora. O vento forte do mar, alguns metros a sua direita, terminava de compor a cena.

— Cadê você, garoto? – murmurou Miller sem tirar os olhos do céu.

A nave Gordoniana se tornou visível sobre a baía da cidade no segundo seguinte – uma enorme sombra se formou sobre a cabeça de Miller de repente; ele pôde ver, por entre as nuvens, Andrew despencando dos céus. Ao ver o garoto Miller correu para seu carro e acelerou ao máximo na direção de Andrew. O homem não sabia ao certo como faria para salvar o garoto, não sabia como ia impedi-lo de tocar fatalmente o chão, mas também não podia apenas olhar.

Enquanto pensava no que ia fazer, meia dúzia de Predadores aram voando por cima de seu carro, deixando apenas o som dos foguetes para trás. Os extraterrestres meio répteis também aceleravam na direção do rapaz que caia rumo a praia; ao mesmo tempo a nave Gordoniana seguia no caminho oposto, indo direto para o centro da cidade.

Desapagado, Andrew começou a cair de ponta cabeça indo cada vez mais rápido; Miller se forçou contra o volante, como se quisesse empurrar o carro para chegar mais rápido no rapaz que já quase tocava o chão. No último minuto um Predador de armadura destroçada deu um rasante, pegando Andrew nos braços e tomando altitude novamente.

O Agente Miller parou o carro quando os Predadores se aproximaram com Andrew nos braços. Apesar de ter ajudado o garoto, Miller deixou sua arma pronta para possíveis ataques. O Predador soltou o rapaz no chão com cuidado

após pousar. Miller se aproximou rápido, se abaixou ao lado de Andrew e o ajudou a se sentar.

— Devagar, garoto – dizia o agente.

— Agente Miller... como você...? – Andrew encarou o homem e então o grupo de Predadores a sua volta.

— Não fui eu.

Sentado sobre o asfalto, cercado de predadores e ao lado do homem que a alguns minutos queria prendê-lo, Andrew sentiu um minuto de alívio. Seu estômago parou de doer e suas pernas pararam de tremer. O Comandante Predador se aproximou de Andrew enfim.

— O que aconteceu lá, garoto? – perguntou Plediax.

— Eles... me enganaram – a voz do rapaz era fraca, não tinha muita energia sobrando no corpo – Pegaram a armadura; arrancaram de mim.

Plediax abaixou a cabeça e fechou os olhos, como alguém que recebe uma notícia fúnebre. Ele se virou para a nave gordoniana sobre a cidade antes de dizer:

— Se estão com o Diorak, então já estamos condenados.

CAPÍTULO ONZE

A nave Gordoniana pairava acima da Cidade Velha – só aquela imagem era assustadora o suficiente. Ela pareceu carregar, abrindo uma luz forte como uma lanterna, e então soltou um grande cubo de metal escuro. As pessoas fugiam já desde antes do grande objeto atingir o chão e levantar pedaços do asfalto. Miller, o grupo de Predadores e Andrew – o rapaz ainda caído no chão – assistiam a tudo de longe, de um dos pontos mais altos da baía. O cubo acendeu repentinamente, ou a pulsar e se desdobrar em vários pedaços, até formar um arco. O Diorak ficou visível no centro do objeto.

— Que coisa é aquela? – Andrew perguntou, ainda com a voz fraca pela extração.

— Aquela coisa é o Modifyl – respondeu Plediax – É um portal para o outro lado da galáxia. Estão iniciando a invasão.

— Com o Diorak, seu desdobramento, potência e alcance serão aumentados – disse um segundo predador; ele tinha uma armadura destroçada, e Andrew o reconheceu do ataque na lanchonete.

— E ele não está alimentando apenas o Modifyl, mas também as naves e armaduras Gordonianas.

— Invasão? – Andrew parecia fora do ar.

O Agente Miller encarou o rapaz e sentiu o peito doer, mas não poderia continuar sofrendo pelo menino, precisava trabalhar. Ele sacou seu celular mais uma vez:

— Aqui é o Agente Miller. Preciso... de todo apoio na baía da cidade. Há uma... eu nem sei descrever.

— Seus soldados não podem fazer nada contra os Gordonianos – o comandante se virou para o agente – Suas forças militares nunca serão o suficiente.

— Quer dizer que devemos desistir?

— Não; desistir nunca será uma opção. Meus soldados e eu vamos impedir a invasão e recuperar o Diorak.

Os Predadores sacaram suas armas sem precisar de mais ordens e saíram voando em direção a nave.

— Não vou ficar parado aqui – o homem guardou o celular outra vez antes de se abaixar ao lado do rapaz – Vamos, Andrew! Precisamos ir!

— É tudo culpa minha – o rapaz olhou nos olhos do agente – Eu deixei isso acontecer.

O Agente retirou seus óculos escuros e, pela primeira vez, Andrew viu em seu olhar algo diferente de certeza e determinação: tristeza.

— Melhor ficar fora disso então – o homem assentiu e pôs a mão no ombro do garoto – Provavelmente estará seguro aqui. Eu espero.

Miller se levantou e pôs os óculos outra vez antes de voltar para seu carro. O agente encarou o rapaz por uma última vez antes de acelerar com tudo na direção da cidade. Ele estava focado na estrada a sua frente, tão focado que mal percebeu a armadura Gordoniana pousar diante de seu veículo. Miller saltou do carro, mas o deixou seguir em direção a armadura; o veículo a atingiu no segundo que começou a atirar, derrubando-a de lado.

Miller sacou sua arma assim que terminou de rolar, mas antes de dar o primeiro tiro uma segunda armadura surgiu atrás dele, fazendo o chão tremer com o pouso pesado. Ele se virou para encarar o gordoniano sorrindo dentro do cockpit enquanto levantava sua arma.

— É claro – o agente suspirou.

Ele ergueu sua arma e atirou junto com seu oponente, mas o disparo da armadura encontrou apenas o chão – Miller caiu no chão pelo impacto ao seu lado. No instante do disparo, o Predador de armadura despedaçada surgiu do céu, pousando sobre a arma e desviando o tiro. O Predador voou alguns metros para frente, atirando contra o da armadura até o vidro estourar. O Predador pegou o Gordoniano e o ergueu, deixando a armadura sem piloto cair sem vida. Ele sorriu para o etzinho verde antes de arremessa-lo para longe.

— É melhor se esconder – disse o predador enquanto pousava ao lado do agente.

— Desistir nunca será uma opção, lembra? – respondeu Miller antes de guardar a arma no coldre e sorrir.

— Então pelo menos use algo mais forte que isso aí.

O predador apontou para armadura tombada, o que fez aumentar ainda mais o sorriso de Miller.

No centro estava o real foco da guerra, com dezenas de Gordonianos e Predadores batalhando uns contra os outros; no centro da batalha estava o Modifyl, ainda se remodelando. No céu um par de helicópteros rodeava a nave Gordoniana. A nave pareceu respirar fundo antes de dar um tiro em cada helicóptero, derrubando-os entre os soldados. No chão, três Predadores voaram até a máquina na tentativa de pará-la; um deles foi alvejado, o segundo foi pego ainda no ar pelas grandes mãos de uma armadura gordoniana, já o terceiro foi o único que chegou realmente perto; um raio repentino saiu do equipamento, como o golpe de uma lança de energia, abatendo o Predador no ar.

Plediax estava um pouco mais afastado, abatendo novas armaduras gordonianas que tentavam chegar na batalha. Duas delas cercaram Plediax. O tiro da primeira errou o Comandante Predador, que voou e abriu fogo contra a cabine de uma armadura, pousando sobre a segunda logo em seguida. A primeira levantou a arma para atirar; Plediax segurou o topo da segunda armadura e voou com dificuldade, levantando-a um metro do chão, o suficiente para fazer o tiro do Gordoniano atingir seu companheiro. O Comandante soltou a segunda armadura e voou contra o outro inimigo, atravessando a armadura de fora a fora, segurando o Gordoniano pelo pescoço.

Enquanto ainda o segurava, Plediax foi atingido por um tiro ao lado. Enquanto se levantava ele pôde ver a armadura de Jildarq, o Comandante Gordoniano se aproximando. Ela era maior que as outras, com detalhes dourados nos braços e na cintura, e um brasão no ombro.

— Veja só você, Plediax, tão pequenino – o comandante gordoniano sorriu em escarnio.

— Jildarq, seu ladrãozinho maldito – respondeu o comandante predador enquanto se levantava – Impedirei sua invasão, custe o que custar, e recuperarei

o Diorak.

— Só por cima do meu cadáver – Jildarq recarregou sua arma.

— Esse é o plano.

O Comandante Gordoniano deu o primeiro tiro, mas o Predador escapou num voo lateral, rodando e pousando sobre a enorme armadura. Jildarq levantou a mão para agarrar Plediax, o balançou e o arremessou, fazendo-o atravessar um ônibus estacionado a alguns metros. O Gordoniano ou a atirar em Plediax através do ônibus. O Predador voou outra vez, desviando dos vários tiros que cortavam o ar, até ser atingido no peito, rodopiar e cair novamente.

Jildarq se aproximou e pisou no predador com seu enorme pé de metal, prendendo o comandante contra o chão. Ele ergueu sua arma e a apontou para o adversário.

— Seus serviços não são mais necessários – o sorriso de Jildarq era tão grande quanto seus olhos negros.

Vários tiros começaram a atingir a armadura de Jildarq e ele se virou; a alguns metros estava o Agente Miller, usando uma das armaduras Gordonianas. O agente continuou atirando, obrigando o comandante inimigo a se afastar. Plediax sacou sua arma e começou a atirar, mas um único tapa da enorme armadura foi o suficiente para fazer o comandante predador rolar pelo chão.

Voltando sua atenção para o agente, com um único tiro, Jildarq arrancou o braço da armadura de Miller, fazendo-o largar sua arma. Os outros tiros não pararam de arrancar pedaços da armadura, e Miller saltou por uma delas assim que teve a chance. Jildarq não parou de atirar, primeiro inutilizando a armadura, e então tentando atingir o agente enquanto esse corria para dentro do prédio a sua direita. Plediax pousou com toda força contra a arma de Jildarq, fazendo-o atirar contra o chão, permitindo que Miller subisse alguns degraus da saída de incêndio dentro do prédio e sacasse seu celular.

— Aqui é o Agente Miller – ele quase gritava contra o aparelho – Preciso de todo reforço possível na minha localização. Tragam armamento pesado!

Andrew, agora sentado sobre as pernas, observava a batalha, inerte em seu lugar. Um Predador – o mesmo da armadura rebentada – pousou ao seu lado.

— Veio aqui me proteger? – perguntou o garoto sem olhar para o predador.

— Vim dizer que você precisa partir ou ajudar na batalha – respondeu a criatura – Não pode apenas sentar e observar.

— E o que eu poderia fazer? O Agente Miller é um policial, e nem ele pode lidar com isso.

— Usou bem o Diorak contra nossas forças, não o Miller.

— Eu fui pego em cinco minutos – o garoto sorriu fraco.

— Tem razão – o predador se virou pra batalha, olhando a energia que emanava do Modifyl – Mas o Diorak é uma das armas mais poderosas da galáxia, e só de um humano sem treinamento não se partir ao meio já é uma grande vitória. Por seu poder, nós nunca venceremos enquanto ele estiver nas mãos dos Gordonianos. Mas nas suas...

— Por que tá falando isso pra mim? Tem uma centena de soldados da sua espécie lá fora.

— Quando chegou à Terra o Diorak o escolheu, Andrew. Essa é a sua chance de provar que ele não errou.

— Mesmo que fosse verdade... – o garoto pensou por um segundo – Como eu o pegaria se está no centro de uma arma alienígena?

— Localizei um pequeno sinal do Diorak num canto remoto da cidade conhecido como... – o predador olhou em seu comm-link – Subúrbio .

Algo se acendeu na mente de Andrew, e enfim ele encarou o Predador. De olhos arregalados ele saltou e ficou de pé.

— Minha mochila...

Andrew dirigia desajeitado pelas ruas do subúrbio da Cidade Velha, quase tombando de lado nas curvas. Não tinha sido difícil arrumar um carro; havia muitos abandonados pela estrada.

— Tem certeza que sabe pilotar este veículo? – perguntou o predador, se segurando sem jeito no banco do ageiro.

— Claro que tenho. Meu pai me ensinou... uma ou duas vezes – respondeu Andrew com um sorriso, mas sem tirar os olhos da via.

Andrew freou bruscamente quando chegou em casa, acertando a lata de lixo sobre a calçada a alguns metros. Ele e o Predador correram juntos na direção da casa; o Sr. Galadaz saiu correndo de lá.

— Andrew... Onde estava? Venha já pra dentro! Que bicho é esse? – o senhor Galadaz gritava em desespero.

Andrew segurou o pai pelo braço e o puxou para dentro de casa – o predador os seguiu. O rapaz fechou a porta e se virou para o pai assustado.

— Pai, eu...

— Precisamos encontrar logo o fragmento do Diorak – o predador os interrompeu.

— Andrew, isso é um alienígena? – as mãos do homem tremiam enquanto ele apontava para a criatura.

— Olha, amigo... – Andrew se virou para o predador.

— Me chamo Reydan – respondeu o predador, enfim se apresentando.

— Reydan, legal. Suba as escadas, primeira porta a direita. É só pegar minha mochila e trazer pra mim.

O Predador assentiu e seguiu escada acima enquanto Andrew voltava atenção para o pai, segurando seus ombros enquanto falava.

— Pai, eu sinto muito por isso tudo, e sinto por te assustar, e por sumir e... por tudo, desde que aquele meteoro caiu.

— O que aconteceu não foi culpa sua.

— Não, o acidente não, mas tudo o que veio depois.

— O que veio depois?

— Tudo aquilo – Andrew apontou para TV ligada numa reportagem sobre a batalha no centro da cidade – Mas posso dar um fim agora; nós podemos.

— Eu diria que você enlouqueceu, filho, mas... tem um ET aqui em casa.

— Obrigado, eu acho...

Uma armadura Gordoniana pousou com um grande estrondo sobre a rua na frente da casa. O rapaz arregalou os olhos ao vê-la pela janela da casa.

— Se esconde, rápido! – ele empurrou o pai enquanto falava.

Enquanto o Sr. Galadaz corria para um lado, Andrew correu para o outro, em direção as escadas, indo direto para se quarto no segundo andar. Lá dentro ele viu o Predador parado no meio do quarto olhando tudo ao redor.

— Tá fazendo o que? – o rapaz perguntou num grito.

— Estou procurando a “mochila”, mas não importa o quanto eu chame, ela nunca vem – Reydan respondeu.

Andrew encarou o Predador e revirou os olhos. Ele caminhou até a cama e pegou a mochila num puxão. Enquanto o rapaz remexia as coisas da mochila, um tiro explodiu a parede da frente do quarto.

— Vou impedir o gordoniano – disse Reydan enquanto sacava sua arma – Encontre o fragmento do Diorak.

O Predador voou pelo buraco na parede sem esperar por respostas. Andrew virou a mochila de ponta cabeça; a placa de petri ficou visível em meio a bagunça devido o fragmento dourado dentro dela. O rapaz a pegou e levantou na altura dos olhos.

— Se você me escolheu então, por favor, me escolha de novo – ele sussurrou.

O rapaz abriu a placa e o fragmento pulou para sua mão, como se respondesse ao seu pedido, envolvendo-a com uma luva dourada – apenas isso.

— Cadê o resto? Maldição.

O rapaz correu até o buraco na parede e contemplou o combate entre Reydan e o Gordoniano por um tempo. As palavras do comandante voltaram a sua mente: o Diorak não estava alimentando apenas o Modifyl, mas também as naves e armaduras Gordonianas. Era como uma bateria sem fio; e se Andrew pegasse de volta? Ele engoliu o seco ao pensar na possibilidade, mas precisava arriscar.

O rapaz estendeu a mão e um cabo se projetou de sua palma, acertando as costas da armadura – essa pareceu instantaneamente levar um choque. Uma energia começou a correr pelo cabo em direção ao rapaz, e o metal dourado começou a preencher o braço esquerdo de Andrew. Quando o metal chegou ao ombro do garoto, a armadura caiu desligada no chão. O Predador puxou o Gordoniano de

dentro da cabine e o arremessou para longe. Reydan voou de volta para Andrew dentro da casa.

— Eu disse que ele te escolheu – falou o predador pairando no ar de frente para o rapaz.

— Parece que sim – respondeu o rapaz encarando seu braço dourado, não com medo como antes, mas com alívio e iração – O fragmento não deu pra muito, mas se tornou maior quando suguei a energia daquele robô.

— A energia é energia bruta do Diorak, o que está alimentando o fragmento; isso o tornará maior aos poucos. Vai precisar da armadura completa se quisermos ganhar.

Andrew sorriu, entendendo o plano do Predador sem precisar de muito mais palavras.

— QUE DROGA É ESSA? – gritou o Sr. Galadaz do corredor atrás deles.

Andrew e o Predador corriam pelo campo de batalha encontrando vez ou outra uma armadura Gordoniana pelo caminho. A cada novo encontro Andrew repetia o procedimento: junto a Reydan ele lutava contra a armadura, usando escudos de energia, canhões e lâminas, esperando a hora certa para sugar a energia dos adversários. A cada nova vitória sua armadura se tornava mais completa. Logo Andrew, Reydan e mais uma dezena de Predadores avançavam pelas ruas como uma confraria, derrubando armaduras uma atrás da outra, limpando a cidade.

Quando lhe faltava apenas o capacete, Andrew encarou uma armadura como se fosse sua presa. O rapaz formou o escudo em seu braço, se protegendo dos tiros do Gordoniano. Não demorou muito para que o escudo começasse a rachar; Andrew podia sentir que não tinha o mesmo poder de quando vestiu a armadura pela primeira vez. Mas o objeto aguentou o suficiente. Ao alcançar a armadura o rapaz deu um salto e se agarrou ao braço direito da armadura. Enquanto o rapaz escalava, a armadura girava tentando atingi-lo com a arma na mão esquerda. Ele se equilibrou nos ombros largos da armadura e estendeu as duas mãos para baixo, lançando os cabos na lataria da armadura.

— Hora de dançar, idiota! – disse o garoto com um sorriso.

O capacete surgia em Andrew enquanto a energia corria pelos cabos. O garoto puxou os cabos de volta, arrebentou a lataria da cabine e levantou o Gordoniano na altura dos olhos. Andrew saltou para um lado e deixou a armadura cair para o outro.

— De volta ao jogo – disse Andrew para o gordoniano em suas mãos antes de apagá-lo com um golpe.

Os predadores se aproximaram e Andrew abriu os braços para apresentar a armadura completa outra vez.

— Bem-vindo de volta.

— Valeu Reydan.

— Eu sou o O'Konell – o predador fez uma careta ao responder.

— Ah, desculpa é que vocês... se parecem muito pra mim – respondeu o garoto.

— Você não está completo ainda, Andrew – Reydan voava alguns centímetros do chão atrás do rapaz – O núcleo do Diorak ainda está na máquina; precisa tirálo de lá pra ter força total.

— É, eu posso sentir – o garoto analisou as mãos douradas – Me sinto fraco, como se estivesse doente.

— Então tá esperando o que?

Reydan e os outros predadores abriram caminho em direção ao Modifyl. Andrew assentiu e saltou algumas vezes antes de começar a correr, e correu alguns metros antes de começar a voar.

Jildarq continuava em sua luta com Plediax. O gordoniano atirava sem parar na tentativa de atingir o predador no ar, vez ou outra tentando pega-lo com a mão, como se tentasse matar uma moca. O Predador reagia atirando na armadura, atingindo suas juntas e o vidro da cabine. Por fim um tiro derrubou Plediax; o Gordoniano se aproximou e o pegou, pressionando o predador contra a parede de um prédio com o cano de sua arma.

— Uma criatura como você só poderia me conceder uma morte desonrosa – disse Plediax enquanto tentava afastar a grande arma do corpo.

— Eu não ousaria tirar sua razão – respondeu Jildarq com seu sorriso sarcástico, como se já sentisse o gosto da vitória.

Jildarq se preparou para atirar, mas o encontrão de Andrew o desestabilizou, fazendo voar alguns metros para longe. O rapaz pousou ao lado de Plediax caído no chão.

— Você está bem? – perguntou Andrew enquanto ajudava o comandante a se levantar.

— Você conseguiu, garoto – o predador sorriu e respirou aliviado – Mas como?

— Eu só precisei... encarar as responsabilidades. E correr até minha casa, precisei fazer isso também – o som da grande armadura gordoniana se movendo puxou a atenção dos dois – Eu volto já.

Num salto Andrew pousou de frente para o Comandante Gordoniano. Jildarq levantou sua arma, mas Andrew parecia conseguir prever seus movimentos; com uma única mão ele a ergueu, desviando o tiro pro céu.

— TIRE SUAS MÃOS DE MIM, HUMANO NOJENTO!

— Você fala muito pra alguém tão pequeno – respondeu o garoto.

De um segundo para o outro a mão livre de Andrew se tornou um canhão, que, com uma rajada, arrancou o braço da armadura do Gordoniano. O rapaz o segurou ainda no ar, usando o braço solto para atingir a própria armadura de Jildarq, primeiro na cabine e então nas pernas, derrubando-o novamente. Andrew segurou um dos pés da armadura e começo a girá-la; ele girou umas cinco vezes sobre o próprio eixo antes de arremessar o inimigo na direção do Modifyl – agora quase do tamanho dos prédios. A armadura do Comandante Gordoniano cortou todo campo de batalha até ser atingido por uma rajada de energia saída do grande portal, desaparecendo no ar.

— Achei um pouco exagerado – disse Reydan ao se aproximar.

— Eu queria que ele derrubasse o portal, mas...

— Sem tempo pra conversa – Plediax os cortou com uma ordem – Você precisa parar o Modifyl agora!

O garoto se virou na direção do aparelho outra vez: estava enorme, e acima pairava a grande nave mãe como um guarda-costas monstruoso. No chão a batalha continuava, agora entre Gordonianos, Predadores e Agentes C.O.A.R. Houve um estalo na mente do rapaz.

— Espera... aquele agente que estava comigo, onde está?

— Está vivo. Agora vá, rápido!

— Mas... rrrrrr! – o garoto urrou, mas obedeceu a ordem.

O garoto começou a correndo, mas logo levantou voo, atravessando o campo de batalha atirando em Gordonianos pelo caminho. Ao chegar perto do Modifyl, um raio se projetou do centro do aparelho, derrubando Andrew a muitos metros de distância. Ele ficou de joelhos enquanto massageava o peito, observando a máquina.

— Droga de raio – ele murmurou entre os dentes antes de criar um canhão em cada mão e atirar; mais uma vez não houve resultado, as rajadas apenas desviaram da máquina – Mas que... Como eu faço isso?

Ele olhou para trás, para batalha, para os predadores e agentes que pareciam perder a cada minuto. O garoto voltou os olhos pra máquina, para o Diorak vibrando de energia no centro dela.

— Você me escolheu? – o rapaz se pôs de pé e criou um escudo em cada braço –

Então prove!

Andrew começou a caminhar, e assim que chegou perto o suficiente os raios voltaram a atingi-lo. Usando os escudos o garoto conseguiu se manter imóvel; ele os uniu num grande escudo e se forçou a dar mais os na direção do portal. Ele gritava de dor, mas não parava de se caminhar.

— Foi você que me escolheu – ele gritou outra vez.

Ao alcançar a máquina ele viu o Diorak com mais clareza: estava preso num cilindro, como um fusível. O rapaz se segurou na lataria da máquina e criou uma lâmina em seu braço direito.

— Você me escolheu, me escolha de novo.

O garoto fincou a lâmina no cilindro, causando uma grande explosão de energia, o que fez parar a batalha ao redor. O Modifyl começou a desmoronar no segundo seguinte. Predadores, agentes C.O.A.R e Gordonianos observavam a cena, alguns com iração e outros com pesar.

Andrew surgiu por entre a fumaça, voando vários metros acima do chão, quase na altura dos prédios ao seu redor.

— Armadura operando em potência total – o rapaz ouviu a voz do Diorak outra vez.

— Ei, você voltou – o garoto sorriu – Bom te ouvir de novo. O que podemos fazer com potência total?

— A nave Gordoniana demonstra um percentual maior de perigo para o povo no momento.

— Então... vamos derrubá-la? – perguntou o rapaz enquanto olhava a nave acima de sua cabeça.

— Me parece a ideia óbvia.

Andrew sorriu pelo sarcasmo da armadura e então voou até seu novo alvo. Ele subiu rápido como um míssil, muito mais rápido do que podia voar antes, atravessou a janela da ponte de comando com um golpe e pousou no centro do lugar. Lá dentro havia dezenas de Gordonianos vestidos de cinza e azul operando a nave.

— Um arinho de metal me contou que aqui é a ponte de comando – disse o rapaz com as mãos na cintura – Parece que rola uma festa irada aqui – os gordonianos começaram a correr assim que os canhões voltaram ao braço do rapaz – Não? Que pena.

Com os canhões o rapaz destruiu tudo que podia alcançar com os olhos e até mais, já que o Diorak sinalizava pontos de interesse ao redor. Quando tudo parecia acabado, o garoto voou para fora outra vez, irando a nave a sua frente.

— Nave Gordoniana perdendo altitude – disse o Diorak.

— ELA TÁ CAINDO? – o rapaz não conseguiu evitar gritar – E o que a gente faz?

— O mar não parece ser um local de vida inteligente.

— Não é, mas... que sacanagem com os peixes. A gente tá tentando evitar a poluição.

Andrew voou até a nave outra vez e começou a empurra-la em direção à baía como alguém que empurra um carro enguiçado. As pessoas olhavam para cima, iradas e paralisadas com a força que o garoto demonstrava agora. Quando a nave tocou um pouco a margem da baía, Andrew sacolejou e soltou o objeto, que em sua maioria caiu quase totalmente na água.

— Funcionou – ele parecia surpreso – E agora?

— Forças Gordonianas subjugadas – respondeu o Diorak.

— Então a gente venceu?

— Apesar de tudo, sim.

Andrew se virou para observar os Predadores e agentes agora prevalecendo sobre os Gordonianos, em sua maioria já fora das armaduras. Ao ver o Agente Miller o rapaz voou de volta e pousou ao seu lado; o agente sacou sua arma por reflexo.

— Mesmo lado – Andrew levantou as mãos em rendição.

— Nunca surpreenda um soldado em guerra, garoto – respondeu Miller enquanto guardava a arma no coldre outra vez.

— Anotado. E aí, como você tá?

— Ferido, mas vivo. E você?

— Incrível. Pus a armadura de novo.

— É, eu vi.

Os Predadores se aproximaram, parando ao redor do garoto a alguns metros do chão; Plediax, o comandante predador, pousou ao lado do rapaz.

— Então... a gente venceu? – perguntou o garoto.

— Depois que você retirou o Diorak de dentro do Modifyl minha força militar pôde reagir – respondeu Plediax – Agora, sem as armaduras, seus militares poderão cuidar deles por si só.

— Parece que eles já começaram – disse Miller enquanto se virava para multidão.

Centenas de Agentes C.O.A.R e militares rendiam gordonianos nas ruas; algumas dezenas deles se aproximavam de Andrew, Miller e dos Predadores, todos prontos para agir.

— Acho que é melhor a gente ir – disse Andrew.

— Retirada total! – ordenou Plediax.

Todos os Predadores voaram em sincronia; Andrew olhou para Miller antes de ir embora com os alienígenas outra vez – desta vez com os certos. Enquanto se afastavam, os agentes e soldados se aproximaram do Agente Miller, que fez um sinal de continência para seu chefe.

— Agente Miller, você tem muito o que explicar – disse o chefe C.O.A.R.

Miller assentiu e teve que segurar um sorriso que queria surgir em seu rosto.

CAPÍTULO DOZE

Andrew e os Predadores estavam juntos de uma grande nave em uma clareira; a luz da lua iluminava bem o ambiente. Alguns Predadores já embarcavam no veículo extraterrestre por um tipo de prancha de entrada. Já Plediax estava do lado de fora com Andrew – ambos sem as armaduras agora.

— Meu pai me ensinou a não seguir estranhos pela floresta – disse Andrew de braços cruzados, irando a nave a sua frente – Imagina ETs. Ficaria decepcionado.

— O que é um ET? – questionou Plediax – É algo bom?

— É claro... – o rapaz pigarreou – Então... acho que é um adeus, não é?

— Imagino que sim.

— Aquele procedimento maluco vai ser tão desconfortável de novo? Por que... eu não garanto que não vou vomitar dessa vez.

— Na verdade, estava pensando em deixar o Diorak em sua posse, pelo menos por hora – o comandante se virou para Andrew.

— Jura? – o rapaz virou para olhar nos olhos do Predador – Mas por quê?

— O Diorak não é uma tecnologia comum; ele tem consciência, e até uma personalidade forte, além de ser muito exigente em relação a seus portadores. Mas ele o escolheu de bom grado.

— Ele meio que me sequestrou, na verdade.

— Ele tentou voltar para nós, mas em momento nenhum tentou deixar você. Se ele o escolheu, nenhum de nós teria coragem de dizer o contrário. E hoje, Andrew, você provou por que o Diorak o escolheu.

— Eu provei?

— Mesmo que os humanos nunca saibam, minha espécie sempre se lembrará de quando um garoto humano salvou todo seu planeta.

— Obrigado, comandante – Andrew sorriu de satisfação.

— Sabe garoto, há centenas de anos atrás, quando minha espécie criou o Diorak, foi com o objetivo de proteger a galáxia, de ser uma sentinela contra uma antiga força maligna. Ela se espalha pelos planetas, de mente em mente, sem piedade. Com o poder que você agora tem em mãos, você agora tem a responsabilidade de prosseguir com esse propósito: proteger as raças que não tem essa capacidade. O Diorak agora é um com você, e ele responderá a todos os seus pedidos, e a cada dia vocês se tornarão mais próximos, e mais fortes. Prometa

que vai continuar usando-o para trazer a paz para todas as raças e povos, e que se manterá nesse caminho, e então o Diorak continuará em suas mãos.

— Considere prometido! – o garoto fez um sinal de continência com a mão – Vou proteger o Diorak, e a todos que precisarem também.

— Que assim seja então – o Comandante Predador estendeu a mão para Andrew, que a apertou com força e comprometimento; o predador o segurou e puxou mais para perto – E caso se desvie para o lado negro, nós iremos atrás de você.

— Tudo bem... – o garoto olhou para os lados; o predador o soltou e Andrew de um o para trás – Mas vem cá, quando você disse “antiga força maligna”...

— Foi um prazer, Andrew.

— O prazer foi todo meu, Comandante Plediax.

O Comandante se virou e seguiu até a nave. Parado na rampa estava Reydan, que acenou em despedida para Andrew antes da nave se fechar. Quando as turbinas ligaram, o rapaz levantou as mãos para proteger os olhos. Num segundo a nave subiu do chão até o espaço.

— Bem... parece que somos só você e eu agora, amigão – disse Andrew com o vazio outra vez.

— É o que parece – ele ouviu o Diorak falar em sua mente – Espero que seus hábitos de saúde e higiene não sejam tão precários quanto sua aparência demonstra.

— EI! Eu acabei de sair de uma luta.

— É um ponto, mas a quanto tempo você não toma um banho?

— Será que ainda dá tempo de devolver você?

O rapaz bufou e criou sua armadura outra vez, alçando voo de volta para casa.

EPÍLOGO

Andrew voltou para casa voando, agora com um pouco mais de controle e conforto. Antes de acertar o chão ele desfez a armadura e se posicionou de frente para porta, entrando em casa no segundo seguinte.

— Legal, agora eu só tenho que pensar bem no que dizer pro meu pai – ele murmurou enquanto fechava a porta devagar.

— Se o “pai” é um problema podemos elimina-lo – sugeriu o Diorak.

— O que? Não, eu não vou eliminar ninguém.

— Eu só estou dizendo.

Depois de ver o pai vindo da cozinha, Andrew sorriu e se jogou sobre o sofá – o alívio foi imediato. Seu pai se aproximou segurando o telefone na mão, com um olhar deprimido.

— Filho...

— Pai, eu posso explicar por que cheguei essa hora e onde eu estava.

— Isso... pode esperar – respondeu o Sr. Galadaz.

— Pode? Você não viu os noticiários?

— Do que você tá falando?

— Do que você tá falando? – Andrew se ajeitou no sofá para olhar direto pro pai.

— Os pais da Natalia me ligaram...

Os olhos de Andrew dobraram de tamanho antes mesmo de ouvir a notícia.

Andrew já estava sentado ao lado da cama de Natália no hospital. Ela ainda estava inconsciente. Os aparelhos ao seu redor piscavam e bipavam fracos, o reflexo perfeito da situação real da menina.

— Me disseram que você pode me ouvir, e que falar coisas boas pode ajudar você a... – as palavras ficaram presas na garganta de Andrew – Você me disse pra ser mais responsável, corajoso, e eu fui. Aconteceu uma coisa... muita maluca; muito mais do que um meteoro explodindo a praça da cidade. Mas eu resolvi. Fiz o que você falou e resolvi – ele deu um sorriso de satisfação em meio as lágrimas que já se formavam – Disseram que você não vai mais acordar, que só está viva pelos aparelhos. Eu ouvi tudo pela porta. Por que isso aconteceu? Por que com você? Por que não comigo? De que adianta salvar o mundo se não posso salvar você?

Ele se debruçou sobre a menina, enfim libertando o sentimento, escondendo o rosto entre os cobertores ao lado do braço da amiga. Mas a tristeza sumiu no minuto seguinte, dando lugar a esperança que se acendeu como uma lâmpada, num momento de lucidez.

— Nós... nós podemos salvá-la? – Andrew falou ao vazio, sabendo que teria uma resposta que apenas ele poderia ouvir.

— Há uma chance de 40% de causarmos sua morte imediata – respondeu o Diorak.

— Isso é uma chance de 60% de salvá-la, certo?

— Matematicamente falando, sim. Mas, se quiser brincar com a vida, sugiro um jogo chamado Roleta...

— Cara... só me diz: podemos salvá-la.

— Eu posso – o Diorak parecia convencido de si mesmo.

— Então... o que eu faço? – Andrew se ajeitou sobre a cadeira, ficando com as costas retas e o peito estufado.

— Estender as mãos, se concentrar no que quer e tentar não estragar tudo.

— Estender as mãos e não estragar tudo – ele engoliu em seco – Eu posso fazer isso.

— Teoricamente – respondeu o Diorak.

O rapaz fez uma careta para o mais novo companheiro de consciência, e então pôs o plano em prática. Ele estendeu os braços, deixando as palmas abertas sobre o corpo da amiga, fechou os olhos e se concentrou no que mais desejava. Suas mãos foram tomadas pelo Diorak, e suas palmas começaram a emanar um brilho intenso.

— Que luva maluca é essa? – ele ouviu a voz fraca de Natália.

Andrew abriu os olhos e a viu acordada, aparentemente ainda mal, mas acordada. O Diorak desapareceu num segundo, e o rapaz se jogou sobre a amiga num abraço.

— Você não sabe como é bom ouvir sua voz irritante – disse ele enquanto se afastava.

— Eu digo o mesmo – respondeu Natália – É bom estar acordada. Eu sabia que estava aí; eu tinha certeza que estaria. Mas as vezes as expectativas se misturavam com a realidade. Sabia que eu ouvi você dizer que salvou o mundo?

— Que... doideira.

— E eu não sei – ela levou a mão a cabeça e olhou ao redor – Cadê meus pais?

— Ah, eles... me deixaram falar a sóis com você – Andrew apontava para o corredor alguns metros atrás de si – Acho melhor chamar alguém responsável.

— Acho que tem razão; estou morrendo de fome.

Andrew assentiu e se levantou com um sorriso enorme no rosto.

— Andrew... – Andrew parou no meio do caminho ao ouvir a voz de Natália –

Obrigada por me salvar.

Os olhos dele acenderam de espanto com a clareza da menina; o rapaz sorriu e assentiu antes de continuar sua caminhada até o corredor, dando uma última olhada na amiga antes de gritar:

— Enfermeira! Ela acordou!