STALLARD, Paul. Guia do terapeuta para os bons pensamentos – bons sentimentos: utilizando a terapia cognitivo-comportamental com crianças e adolescentes (Trad. Maria Adriana Veríssimo Veronese). Porto Alegre: Artmed, 2007. CAP 2- Engajamento e prontidão para a mudança Engajando a criança Segundo Graham (2005), o engajamento requer que a criança reconheça:
Que existe uma dificuldade ou problema; Que esse problema pode ser modificado; Que a forma de ajuda oferecida pode promover essa mudança; Que o terapeuta é capaz de ajudar a criança a desenvolver as habilidades necessárias para que ela consiga essa mudança. (p. 21)
Por se tratar de um processo complexo, algumas dificuldades devem ser reconhecidas são elas:
As crianças não costumam buscar ajuda por conta própria, o que torna o processo de engajamento e a motivação muito limitados no início. As crianças talvez não compartilhem as preocupações daqueles que as encaminharam As crianças podem achar que a responsabilidade pelo problema que as traz ao tratamento é de outra pessoa. As crianças pode ser incapazes de pensa sobre como as coisas poderiam ser diferentes ou de identificar alvos específicos. (p. 21)
Por essas e outra razões as crianças podem ser inicialmente relutantes e desta forma é preciso prestar atenção a motivação e a prontidão da criança à mudança.
Os estágios de mudança O modelo de estágios de mudança esclarece como a prontidão do cliente para a mudança é um processo que se desenvolve gradualmente e varia conforme o tempo. Ele oferece uma estrutura que pode ajudar o terapeuta a orientar e adaptar o foco do processo terapêutico no nível apropriado.
Pré-contemplação É neste estágio que muitas crianças tem o primeiro contato com o terapeuta. Elas chegam a sessão em virtude da pressão de alguém, apresentam pouca ou nenhuma consciência de que o problema existente é parte delas, e não consideram a necessidade ou possibilidade de mudança. (p. 22) O objetivo deste estágio é salientar a discrepância entre a situação atual e o que a criança gostaria de conseguir. (p.23) Contemplação A partir desse estágio a criança começa a identificar algumas possíveis áreas que ela gostaria de mudar, mas pode demonstrar insegurança sobre a possibilidade de conseguir isso. (p.24) O objetivo desse estágio é a realização de uma cuidadosa análise da ambivalência e de potenciais obstáculos, a fim de maximizar a probabilidade de sucesso subsequente. (p. 25). Preparação A meta terapêutica neste estágio é ajudar a criança a identificar metas modestas, realistas e atingíveis, maximizando a possibilidade de uma experiência bem-sucedida (p. 25) O terapeuta adota um foco positivo, enfatizando habilidades e estratégias úteis da criança, ao mesmo tempo que lança luz sobre outras possíveis armadilhas que precisam ser consideradas e tratadas. (p.25) Ação Nesse estágio a criança encontra-se pronta para engajar-se completamente na terapia e assegurar mudanças definitivas. (p. 26) O estágio da ação é quando a TCC é posta em execução e se atinfe uma mudança significativa. Os objetivos e o processo que vai assegurar a sua realização precisam ser explicados e regularmente revisados. (p. 27) Manutenção Durante o estágio de manutenção a criança é ajudada a integrar suas habilidades à vida cotidiana e a planejar o que fazer nas dificuldades que surgirem. (p.27) Recaída Durante o estágio de recaída, o objetivo é ajudar a criança é refletir sobre habilidades e estratégias que se mostraram úteis no ado e incentivar seu uso. (p.28)
Entrevista Motivacional Princípios da entrevista motivacional O objetivo da entrevista motivacional é desenvolver a discrepância entre a situação atual e o que a criança idealmente desejaria. Acredita-se que a discrepância motiva a criança a buscar seus objetivos. (p.28) A entrevista se baseia nos seguintes princípios: A motivação para as mudanças vem do interior da criança, e não por persuasão externa; A ambivalência da criança precisa ser articulada e resolvida. O terapeuta trabalha em parceria com a criança para facilitar ativamente esse processo. A resistência é uma reação ao comportamento do terapeuta e não constitui o problema da criança. Prontidão. Importância e confiança A motivação da criança para mudar é multidimensional e, segundo Rollnick e colaboradores (1999), incorpora as dimensões de importância (reconhecimento e a necessidade que a criança sente de buscar resultados diferentes), prontidão (tem a ver com quão preparada a criança se sente para embarcar num processo ativo de mudança) e confiança (capacidade da criança, e quão eficaz ela se percebe, para conseguir mudanças desejadas). Ou seja, a motivação vai depender da percepção da criança de quão importante é a mudança, quão pronta ela está para mudar e quão confiante está de conseguir isso. (p. 31)
Técnicas de entrevista motivacional A entrevista motivacional usa técnicas para: Promover empatia por meio de resumos e escuta reflexiva; Criar discrepância por meio de perguntas de final aberto e salientar as contradições da criança; Mover-se acompanhando a resistência, não interferindo e adotando a escuta reflexiva; Ressaltar a auto-eficácia pela afirmação e atenção seletiva. (p. 33) Definir a abordagem O terapeuta precisa reservar um tempo na primeira entrevista para se diferenciar dos outros adultos e explicar claramente a filosofia da sua abordagem. (p. 34)
Lidar com comportamentos sérios e preocupantes Haverá situações em que a criança precisa ser confrontada com a gravidade de seus comportamentos independentemente de ela considera-los um problema ou falar a respeito de sua gravidade. Mas isto não precisa ser o foco da intervenção, pois o terapeuta pode transmitir suas ideias de forma clara e factual. Ex: “Estou preocupado com o fato de você se setor tão por baixo que acaba se cortando intencionalmente”. (p.34) Lidar com a resistência e contramotivação A entrevista motivacional tem o objetivo de resolver a ambivalência e reduzir a resistência (contramotivação). A contramotivação pode ocorrer por quatro razões comuns: O terapeuta provoca ividade na criança com a armadilha da pergunta e resposta. O terapeuta tenta persuadir a criança na armadilha da confrontação e negação O terapeuta corre na frente, antes que a criança se aproprie da situação, e cai na armadilha do especialista. O terapeuta e a criança ficam presos em disputas inúteis na armadilha da culpa. Quando a TCC não é indicada? Há alguns casos em que a TCC não é indicada, isto está relacionado aos seguintes aspectos: A natureza do problema apresentado: Internalizante ou externalizante; As características do problema apresentado: com comportamentos de baixa frequência; Os múltiplos problemas apresentados: sessões que perdem o ímpeto ou o foco; O contexto sistêmico em que o problema se apresenta: influências sistêmicas dominantes; O desenvolvimento linguístico e cognitivo da criança: as capacidades cognitivas, linguísticas ou mnemônicas da criança forem limitadas.
CAP 6 – O processo socrático e o raciocínio indutivo Facilitando a autodescoberta
A TCC útil para crianças e adolescentes é aquela firmemente inserida em um processo socrático que os ajuda a descobrir, avaliar e reavaliar suas cognições. (p.67)
O processo é positivo, capacitante e apoiador, e baseia-se em um questionamento genuíno e aberto, que transmite interesse e revela que o terapeuta realmente quer compreender como a criança pensa, se sente e se comporta. (p.67) As perguntas são enunciadas cuidadosamente para dirigir e mantem o momentum terapêutico. Isso orienta a criança e a ajuda a questionar sistematicamente suas definições universais e a se engajar em um processo de raciocínio indutivo, por meio do qual cognições importantes são exploradas e reavaliadas. (p.68) As pergunta do terapeuta ajudam a criança a prestar atenção a informações e a considera-las que ela previamente ignorou ou considerou sem importância. (p.68) O processo socrático é colaborativo e permite que a criança estabeleça um novo entendimento que, simultaneamente, faz sentido e a auxilia. (p.68) As perguntas do terapeuta devem, ao mesmo tempo, modelar e facilitar o processo da descoberta orientada. (p.68)
A estrutura do processo socrático
O processo socrático envolve: Eliciar e identificar cognições importantes e sentimentos e comportamentos associados; Ajudar a criança a prestar atenção a informações novas ou ignoradas; Sintetizar e integrar novas informações e Reavaliar antigas cognições e desenvolver uma estrutura cognitiva mais equilibrada Isso ocorre em um contexto colaborativo que envolve o uso de: Escuta empática e Resumos e reflexões. (p.69)
Raciocínio Indutivo
Raciocínio indutivo é o processo pelo qual a criança é ajudada a explorar e analisar semelhanças e diferenças entre eventos. Isso auxilia a identificar e testar supergeneralizações, vieses de escolha e pensamento dicotômico o que, por sua vez, leva ao estabelecimento de limites apropriados e ao desenvolvimento de cognições alternativas mais equilibradas. (p.69)
O raciocínio indutivo com crianças envolve, tipicamente, duas abordagens principais: 1) Ajudar a criança a prestar atenção a informações novas ou ignoradas que lhe permitam reconsiderar e revisar suas generalizações e vieses 2) Avaliar sistematicamente as relações que fundamentam suas crenças e suposições cognitivas
Adquirir novas informações Métodos: 1) Considerar a crença ou suposição de uma perspectiva diferente; 2) Chamar atenção para informações novas ou ignoradas; 3) Usar comparações analógicas para ajudar a criança a considerar diferenças importantes, mas não imediatamente óbvias. (p.70)
Testar sistematicamente a suposta relação
A criança, muitas vezes, faz suposições sobre a relação entre eventos e conclui que um evento é a causa de outro. É preciso ajudá-la a testar sistematicamente essa relação e isto pode ser feito por meio do raciocínio causal que envolve uma análise lógica dessas suposições, confirmando o invalidando a suposta relação. (p.72)
Confirmação: Pode ser feita através de um experimento comportamental em que a criança investiga a suposta relação. (p.72) Desconfirmação: Envolve a criança descobrir a complexidade da relação que ela supõe existir, pelo detalhamento das múltiplas etapas que precisariam ocorrer antes que suas cognições possam se tornar realidade. (p.72)