O DIA EM QUE EU NASCI MOURA E PEREÇA
Camões (…) “«não tem biografia», não tem lugar nem tempo, antes tudo isso ele tem (diria: enormemente), apenas e só, naquilo que escreveu. Que escreveu? Apetece-me dizer: que escreve.”
Pedro Tamen
O dia em que eu nasci moura e pereça O dia em que eu nasci moura e pereça, Não o queira jamais o tempo dar; Não torne mais ao Mundo, e, se tornar, Eclipse nesse o o Sol padeça. A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça, Mostre o Mundo sinais de se acabar, Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar, A mãe ao próprio filho não conheça. As pessoas pasmadas, de ignorantes, As lágrimas no rosto, a cor perdida, Cuidem que o mundo já se destruiu. Ó gente temerosa, não te espantes, Que este dia deitou ao Mundo a vida Mais desgraçada que jamais se viu! Luís de Camões
O dia em que nasci moura e pereça O dia em que eu nasci moura e pereça, Não o queira jamais o tempo dar; Não torne mais ao Mundo, e, se tornar, Eclipse nesse o o Sol padeça. A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça, Mostre o Mundo sinais de se acabar, Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar, A mãe ao próprio filho não conheça. As pessoas pasmadas, de ignorantes, As lágrimas no rosto, a cor perdida, Cuidem que o mundo já se destruiu.
Ó gente temerosa, não te espantes, Que este dia deitou ao Mundo a vida Mais desgraçada que jamais se viu! Luís de Camões
O seu nascimento foi maldito. Diferencia-se dos outros homens até na desgraça. Ele é superior, o seu nascimento foi apocalíptico. O eclipse corresponde ao fim do mundo, era uma intenção divina.
O poeta amaldiçoa o dia em que nasceu e deseja, que se se voltar a repetir, se deem fenómenos extraordinários para que todos fiquem sabendo que nesse dia nasceu a pessoa mais desgraçada.
O dia em que nasci moura e pereça O dia em que eu nasci moura e pereça, Não o queira jamais o tempo dar; Não torne mais ao Mundo, e, se tornar, Eclipse nesse o o Sol padeça. A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça, Mostre o Mundo sinais de se acabar, Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar, A mãe ao próprio filho não conheça.
Amaldiçoa o dia em que nasceu
Cenário Monstruoso
As pessoas pasmadas, de ignorantes, As lágrimas no rosto, a cor perdida, Cuidem que o mundo já se destruiu.
Prevê a reação das pessoas
Ó gente temerosa, não te espantes, Que este dia deitou ao Mundo a vida Mais desgraçada que jamais se viu!
Lança o repto final
Luís de Camões
O dia em que nasci moura e pereça O dia em que eu nasci moura e pereça, Não o queira jamais o tempo dar; Não torne mais ao Mundo, e, se tornar, Eclipse nesse o o Sol padeça. A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça, Mostre o Mundo sinais de se acabar, Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar, A mãe ao próprio filho não conheça.
O eu lamenta ter nascido, assumindo uma atitude masoquista nos pedidos formulados, cujos efeitos poderão atingir toda a humanidade. O dia do nascimento surge aqui amaldiçoado, mas também personificado, sugerindo o seu poder destruidor.
As pessoas pasmadas, de ignorantes, As lágrimas no rosto, a cor perdida, Cuidem que o mundo já se destruiu.
Efeitos produzidos nos humanos pela transformação que o sujeito espera que ocorra na natureza.
Ó gente temerosa, não te espantes, Que este dia deitou ao Mundo a vida Mais desgraçada que jamais se viu!
Justifica-se e confirma-se o pedido auto e hetero destrutivo que inicia e percorre todo o texto
Luís de Camões
O dia em que nasci moura e pereça O dia em que eu nasci moura e pereça, Não o queira jamais o tempo dar; Não torne mais ao Mundo, e, se tornar, Eclipse nesse o o Sol padeça. A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça, Mostre o Mundo sinais de se acabar, Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar, A mãe ao próprio filho não conheça.
CONJUNTIVO INFINITIVO INDICATIVO
As pessoas pasmadas, de ignorantes, As lágrimas no rosto, a cor perdida, Cuidem que o mundo já se destruiu.
Ó gente temerosa, não te espantes, Que este dia deitou ao Mundo a vida Mais desgraçada que jamais se viu! Luís de Camões
INDICATIVO
O dia em que eu nasci moura e pereça Personificação Anáfora
Metáfora
O dia em que nasci moura e pereça, Não o queira jamais o tempo dar; Não torne mais ao Mundo, e, se tornar, Eclipse nesse o o Sol padeça.
PLEONASMO
HIPÉRBOLE
A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça, Mostre o Mundo sinais de se acabar, Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar, A mãe ao próprio filho não conheça. As pessoas pasmadas, de ignorantes, As lágrimas no rosto, a cor perdida, Cuidem que o mundo já se destruiu.
Apóstrofe
Antítese
Ó gente temerosa, não te espantes, Que este dia deitou ao Mundo a vida Mais desgraçada que jamais se viu! Luís de Camões
Enumeração
ANÁSTROFE
ADJETIVAÇÃO
Modo conjuntivo: exprime uma vontade
não sei se o camões hoje teria escrito as suas rhythmas, começa porque não saberia ao certo quais eram e então não havia camonistas para discutirem a questão. e depois talvez não valesse a pena falar àquela gente. e os auditórios têm limites de paciência. por exemplo, o dia em que eu nasci moura e pereça, diz-me o aguiar e silva, não é dele quase de certeza. e eu respondo: é tão bom que tem mesmo de ser dele. e o vítor ri, exclamando: você já está como o faria e sousa. a ironia desta conversa é que ela se ava no instituto camões, calcule-se, somos ambos do conselho geral, tratando da expansão da língua portuguesa que se mais mundo houvera lá chegara
e estava uma tarde esplêndida de janeiro e se o camões estivesse ali não havia de acreditar que um de nós estivesse prestes a tirar-lhe um soneto o mais doutamente possível e o outro lho quisesse devolver, invocando-lhe o som, a fúria e o sentido, nem que há séculos que as coisas se vão ando assim, tirando e pondo, invocando lições e testemunhos, e uns gajos de nome germânico, lachmann, storck, e mais alguns. a moral da história é que um verso de camões com pouca variação é sempre um verso de camões, é a coisa mais bela e mais difícil do mundo e dá cá uma guinada tão especial que só pode ser dele. Vasco Graça Moura (1993)